São Paulo, segunda-feira, 31 de outubro de 2011

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Aos 61 anos, Tom Waits retoma as raízes inquietas

Por JON PARELES

PETALUMA, Califórnia - Adrenalina e inquietação percorrem "Bad as Me", o novo álbum de Tom Waits e seu primeiro disco completo de canções inéditas desde "Real Gone", de 2004.
Aos 61 anos de idade, Waits é aclamado como uma maravilha americana: um letrista capaz de ser estridente e meticuloso, etéreo e terreno, sombrio e cômico. Ele já cantou sobre bêbados, vagabundos e assassinos, contando histórias improváveis e desfiando associações livres que, de alguma maneira, acabam convencendo.
Além disso, já mostrou um lado vulnerável em canções de amor ternas, não irônicas. Tom Waits vem gravando há quatro décadas, forjando um som que condiz com sua voz e suas letras: em parte América antiga e estranha, em parte escultura de lixo, em parte experimento de cientista maluco, em parte cartum, em parte sermão que promete o fogo dos infernos.
Embora tenha apenas um álbum de ouro nos EUA -"Orphans: Brawlers, Bawlers & Bastards", coletânea de 2006- Waits, que este ano foi incluído no Hall da Fama do Rock'n'Roll, é prezado por sua geração de músicos e visto como um letrista habilidoso e um outsider que não se vende.
Quando Waits surgiu, nos anos 1970, era evidente que tinha estudado os escritores beat, os pioneiros do jazz e os bluesmen do Delta. Hoje, roqueiros indie o estudam.
Os sete anos passados entre álbuns novos foram ativos. Tom Waits e Kathleen Brennan, sua mulher e parceira na composição e produção, produziram "Orphans". Waits viajou em turnê pela América e Europa, lançou um álbum gravado ao vivo, "Glitter and Doom Live", e atuou em filmes (como "O Livro de Eli", no ano passado).
Neste ano ele viveu uma explosão de criatividade que resultou em "Bad as Me". As letras são diretas. "Você é a cabeça na lança, você é o prego na cruz / você é a mosca em minha cerveja, é a chave que se perde", ele canta na canção-título.
É um álbum de canções de amor, contemplações irônicas da morte e, mais frequentemente, canções sobre pôr o pé na estrada. "Simplesmente quero sumir daqui", ele declara em "Get Lost".
Os arranjos reproduzem o misto de algo do passado surreal que Tom Waits aprecia há muito tempo, com guitarras metálicas, trompas agressivas, piano de saloon e bateria que faz o ouvinte pensar em bares de beira de estrada e tatuagens militares. Há meia dúzia de "blues stomps", com Keith Richards participando dos embates de guitarra com David Hidalgo, de Los Lobos, e o eclético líder de banda e freelancer Marc Ribot.
Há também três canções lentas, para dançar. "Back in the Crowd" é uma balada country com toques de mariachi. "Kathleen queria fazer 12 canções de três minutos", afirmou Waits. "Eu estava distribuindo versos por todo lugar e fazendo cortes." O álbum acabou com 13 canções em sua versão padrão e 16 na versão de luxo.
Tom Waits queria escrever canções em que se demorasse sobre algo. "Como em um blues: você vai lá e se demora sobre um tópico qualquer", disse. "Era algo simples, mas evocava tanto." Embora suas canções muitas vezes tragam à mente noites que se prolongam até a madrugada, um fato surpreendente é que Waits prefere gravar logo cedo pela manhã.
"Antigamente eu achava que grandes álbuns eram feitos às 3h da manhã, até que tentei gravar às 3h da manhã." Ele faz sugestões a seus músicos convidados. "Quero que você toque como se tivesse 7 anos e estivesse num recital." Ou "toque como se estivesse sem calças".
Ribot, Hidalgo e Keith Richards trabalharam separadamente, A mixagem ficou para mais tarde. Enquanto isso, a voz de Tom Waits geralmente é gravada de uma só vez.
Quando conversa, Waits discute as sutilezas de gravar batidas de palmas e a sorte de encontrar sentido em rimas triplas. Estas, ele inclui em uma canção nova, "After You Die", para refletir sobre o esquecimento.
"Há verdades que saem de algo que aparenta ser não mais que um jogo de palavras. É isso que eu acho misterioso no significado das coisas: elas se desatarraxam das palavras práticas."
Uma valsa, "Last Leaf", celebra a imagem de uma única folha ainda agarrada a uma árvore: "O outono levou as outras, mas não vai me levar", ele canta.
"Poderíamos dizer que tudo é uma metáfora de todo o resto, mas às vezes é apenas o que é. Essa canção é sobre isso apenas -uma árvore."


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