São Paulo, domingo, 04 de julho de 2004

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OMBUDSMAN

Pesquisas, uso e abuso

MARCELO BERABA

Foi uma semana de pesquisas de intenção de voto e de avaliação administrativa. O leitor não tem mais dúvida: estamos em período eleitoral e as pesquisas vieram para ficar. É bom, portanto, acautelar-se.
A Folha publicou as suas ao longo de toda a semana. A principal foi no domingo, manchete do jornal: "Serra lidera isolado em São Paulo". Tinha também uma avaliação da administração Marta Suplicy (PT), ambas feitas pelo Datafolha.
Na segunda-feira saiu, também do Datafolha, uma avaliação do governo Alckmin (PSDB). Na terça, todos os jornais deram as pesquisas de intenção de voto do Ibope em São Paulo ("Ibope aponta liderança de Serra em SP", resumiu a Folha) e no Rio ("Maia lidera no Rio com 18 pontos de folga, diz Ibope").
Na quarta, o Ibope teve de se explicar. A pesquisa que fizera entre os dias 15 e 18 de junho, paga pelo PT, dava um empate técnico entre os três principais candidatos em São Paulo: José Serra (PSDB) com 22%, Marta Suplicy (PT) com 21% e Paulo Maluf (PP) com 18%. A pesquisa publicada na terça tinha sido feita entre os dias 25 e 27 de junho, dez dias depois da primeira, foi paga pela TV Globo e deu um resultado bem diferente: Serra já liderava com 30%, Maluf tinha 21% e Marta, 16%.
É estranho uma mudança tão grande em tão pouco tempo. Segundo o instituto, a grande diferença entre as duas pesquisas era resultado da influência dos programas eleitorais no rádio e na TV. A pesquisa do PT foi realizada depois do programa do partido, e a pesquisa da Globo, depois das propagandas gratuitas de Serra e Maluf.
Na quinta-feira, saiu no "Estado" a pesquisa do Instituto GPP/ InformEstado, realizada praticamente no mesmo período da do Ibope e com resultado um pouco diferente: Serra tinha 33,1%, Maluf, 26,8% e Marta, 15,2%. A pesquisa do Datafolha, publicada na Folha de domingo, também era do mesmo período (24 e 25 de junho) e com outro resultado para a candidata do PT: Serra tinha 30%, Maluf, 24% e Marta, 20%.
São diferenças numéricas às quais os institutos não dão muita importância porque consideram que estão dentro da margem de erro. A margem de erro é determinada pelo número de eleitores pesquisados. O Datafolha ouviu 1.083 eleitores (margem de erro de 3 pontos percentuais), o Ibope, 1.001 (margem de 3,1 pontos percentuais) e o GPP/ InformEstado, 606 (margem de 4 pontos). Além disso, explicam, as três pesquisas têm metodologias diferentes.
A rodada de pesquisas da semana continuou. Na quarta, os jornais publicaram o levantamento da CNI/Ibope que avaliou o governo federal. Títulos dos diários de maior circulação: "Aprovação de Lula cai de 34% para 29%" (Folha); "Ibope mostra governo Lula em queda há 15 meses" ("Estado"); e "Ibope: popularidade e confiança em Lula caem" ("Globo").
Na quinta-feira, o "Estado" publicou, com a pesquisa de intenção de voto, a avaliação do governo Marta. E novas discrepâncias surgiram, agora fora da margem de erro.
O Datafolha e o GPP/InformEstado fizeram suas pesquisas, como informei, praticamente nas mesmas datas: 24 e 25 (Datafolha) e 26 e 27 (GPP). No Datafolha, Marta tem 29% de ótimo/bom, 37% de regular e 33% de ruim/péssimo. No GPP, ela tem 18,6% de ótimo/bom (dez pontos percentuais a menos), 39,6% de regular e 41,5% de ruim/péssimo.
É verdade que as pesquisas não podem ser lidas como uma verdade absoluta: são apenas flagrantes de um determinado momento. Mas as diferenças saltam aos olhos e incomodam.
Os institutos têm explicações metodológicas para quase tudo, mas há problemas que não podem ignorar. Fazer uma pesquisa logo após a realização de comerciais do partido que a está pagando é, no mínimo, passível de questionamento.
Para os partidos, isso deve ser ótimo, porque passam a impressão de uma vantagem que, sabem, é artificial e não será mantida. Mas, para os institutos e, principalmente, para os meios de comunicação, é colocar em jogo a credibilidade porque sobre eles pesará a suspeita legítima de manipulação.
Os jornais devem se preocupar em abrir para os seus leitores todas as informações essenciais para que entendam as pesquisas e possam questioná-las.


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