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O debate necessário
Embora uma parte das críticas à imprensa sejam tentativas de intimidação, não resta dúvida de que a cobertura das eleições foi falha
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O FIM DA ELEIÇÃO presidencial no domingo
passado não foi suficiente para fazer baixar o tom
das críticas do PT, de membros do governo federal e dos
partidos (vencedores e derrotados) à imprensa. As queixas
e acusações contra os meios
viraram rotina desde o ano
passado, quando a Folha publicou as denúncias de corrupção feitas pelo ex-deputado federal Roberto Jefferson
contra o governo federal e sua
base aliada no Congresso.
Ao longo da semana passada, a situação ficou mais tensa
com as agressões sofridas por
jornalistas em frente ao Palácio da Alvorada, as críticas
desferidas por membros qualificados do governo federal e
pelo governador reeleito do
Paraná, Roberto Requião, e os
interrogatórios dos jornalistas
da revista "Veja" pela Polícia
Federal no inquérito em que
foram chamados como testemunhas, mas se sentiram interrogados como réus. Esses
fatos provocaram forte reação
editorial dos meios.
A minha impressão é de que
esta foi a campanha em que a
imprensa foi mais duramente
questionada. Certamente a internet teve um peso importante porque criou, e não pára de expandir, o novo espaço de
circulação e enfrentamento
de idéias sobre o papel da mídia e sobre a cobertura específica desta eleição. É um debate
que os meios tradicionais têm
dificuldades de acolher.
Identifico três aspectos nas
críticas agora direcionadas à
imprensa. Primeiro, há o
questionamento em relação à
qualidade das coberturas, o
que abrange a precisão das informações, o equilíbrio editorial, os enfoques e os vieses.
Embora uma parte das críticas esteja contaminada pelo
ressentimento e outro tanto
faça parte da tentativa de intimidar os meios, não tenho dúvida de que foi uma cobertura
falha. Houve erros factuais
graves e em vários momentos
ficou patente, pelos exageros e
pela insistência em picuinhas
e irrelevâncias, a má vontade
com Lula e o seu governo.
Mas os meios fizeram o que
tinham de fazer ao divulgar
ininterruptamente e com visibilidade as dezenas de denúncias de corrupção, irregularidades e tramas "alopradas".
Devem ser criticados, neste
capítulo, por não terem ido
mais fundo por conta própria,
perpetuando a dependência
das CPIs (e, portanto, do jogo
eleitoral), da Polícia Federal e
do Ministério Público.
E devem ser criticados pelo
que deixaram de fazer. As administrações tucanas no Estado e na cidade de São Paulo, por exemplo, foram mal cobertas. Evidência desse desinteresse, no caso da Folha, é que a informação sobre o déficit financeiro do Estado só
apareceu no finalzinho do primeiro turno e por esforço da
colunista Mônica Bergamo
-fora, portanto, da cobertura
rotineira do jornal.
E os leitores ainda esperam
um balanço da política de segurança pública no Estado
nos últimos 12 anos para que
possam entender como foram
possíveis as seguidas explosões de ataques do PCC que
paralisaram São Paulo e cidades do interior. Essas falhas
podem ser estendidas para
outras áreas da administração
pública cobertas esporadicamente e sem profundidade.
As críticas relativas à qualidade e ao enfoque das coberturas fizeram aflorar dois outros questionamentos legítimos, mas nem sempre bem direcionados. Primeiro, o papel
da imprensa numa sociedade
em desenvolvimento e numa
democracia em construção.
Junto, a discussão sobre a democratização dos meios de
comunicação, aí entendidas
principalmente a política de
concessão de rádios e TVs e a
altíssima concentração de audiências e do bolo publicitário,
que sustentam o modelo de
comunicação construído a
partir da década de 1960.
Em relação ao papel da imprensa, um parêntese: há um
grave problema quando um
intelectual como Marco Aurélio Garcia, chefe da campanha
vitoriosa da reeleição e presidente em exercício do PT, assim reage aos repórteres que
querem informações sobre o
futuro do partido: "Cuidem de
suas Redações que nós cuidamos do PT". Engano: interessa à sociedade brasileira e, portanto, à imprensa o que
acontece no PT e como será
formado o novo ministério.
A discussão sobre o papel da
imprensa e sobre a democratização dos meios está contida,
mas não será assim por muito
tempo. Antes restrita a setores das universidades e a líderes de movimentos sociais, a discussão explodiu, nesta eleição, na internet. A imprensa
tradicional erra ao não dar espaço para o debate esclarecedor das idéias e propostas em
jogo (mesmo as que considera
equivocadas) e a só se manifestar quando se sente agredida. O longo silêncio que se concede faz parecerem histéricos, desproporcionais ou
meramente corporativos os
gritos que emite quando lhe
pisam os pés.
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