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O Pará é logo ali
A Folha noticiou, na quarta-feira, que a Vale do Rio Doce, cansada de "chantagem",
cancelou a ajuda financeira de
R$ 9 milhões que destinaria
neste ano a índios do grupo
Xicrin estabelecidos em terras próximas de Carajás, no
sul do Pará. Carajás é a maior
base de extração de minério
de ferro da companhia. E a
companhia é, desde 24 de outubro, quando comprou a canadense Inco por pelo menos
US$ 13,2 bilhões, a segunda
maior mineradora do mundo.
A chantagem a que a empresa se refere é a tática dos
índios, insatisfeitos com o que
recebem, de invadir Carajás
-e isso já ocorreu diversas vezes- e paralisar a extração de
minério. O conflito entre os
índios e a Vale é antigo, e a Folha o acompanha com a pouca
visibilidade editorial e com a
irregularidade que caracteriza
a cobertura da Amazônia, onde o jornal só tem um correspondente, em Manaus.
As informações sobre o contencioso entre índios e a mineradora saem de três fontes:
a Vale, que tem sede no Rio e
por isso geralmente é ouvida
pela Sucursal na cidade, as lideranças indígenas e a Funai,
que são ouvidas pelo Rio ou
pela Agência Folha, por telefone. O jornal não considerou
prioritário até agora enviar
jornalistas para verificar in loco o que ocorre em Carajás.
Embora as reportagens tenham sempre contemplado os
dois lados do conflito, vários
pontos continuam obscuros.
O primeiro é o caráter da ajuda. Segundo a Vale, citada pela
Folha, é uma ajuda "voluntária" e não representa uma indenização aos grupos indígenas pelo uso do solo. No entendimento da Funai e das lideranças Xicrin, não se trata
de ajuda, mas de direito garantido por decreto presidencial de 1997 que autoriza o uso
da área em troca de "amparo
às populações indígenas".
O outro ponto que as reportagens à distância não permitiu esclarecer é relativo à quantia destinada aos índios.
Segundo as informações colhidas pela Folha na Vale, teriam sido R$ 6 milhões em
2005 e seriam R$ 9 milhões
neste ano, agora suspensos.
Segundo os índios, seriam R$
4 milhões em 2006.
A ida de uma equipe permitiria observar diretamente o
que está acontecendo neste
conflito entre desiguais. Na
guerra pela opinião pública, a
Vale leva evidente vantagem
pelo que representa nacionalmente, pela proximidade com
os meios e pela força econômica expressa nos anúncios que
se tornaram freqüentes nos
jornais para se explicar.
O jornal dá evidências de
que recupera a capacidade de
investimento na Redação depois dos anos recentes de crise
financeira. Os gastos nas eleições federais e estaduais deste
ano e a presença mais freqüente nos países vizinhos -como
agora, na assinatura do novo
acordo entre a Petrobras e o
governo da Bolívia- são indicadores desta melhora.
A Amazônia -onde o conjunto de conflitos agrários, indígenas e ambientais faz o enfrentamento entre a Vale e os
Xicrin parecer um caso menor- deveria estar no topo das
prioridades do jornal. É possível continuar cobrindo o Pará
por telefone; mas não é possível fazê-lo bem.
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