São Paulo, domingo, 06 de março de 2005

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ENTREVISTA

"Também gosto de frescura"

Foi uma quarta-feira de reclamações contra a imprensa.
No Uruguai, segundo relato da Folha na edição de quinta, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva "se mostrou aborrecido" quando lhe perguntaram sobre suas declarações a respeito de corrupção no governo Fernando Henrique. "Um dia vou perguntar para a imprensa o que ela acha da repercussão sobre o assunto", disse. Para o "Estado de S.Paulo", o presidente respondeu "irritado"; para "O Globo", ele ironizou.
Na mesma quinta, os jornais publicaram a reação do ministro Gilberto Gil (Cultura) às reportagens que o incluíam no rol dos que reclamaram contra os cortes no Orçamento para este ano. Na Folha, o título de quarta-feira foi "Gil, Rossetto e Dutra reclamam do arrocho"; na quinta, "Gil diz que imprensa é manipuladora, mas volta a criticar corte orçamentário".
Entrevistei o ministro na própria quinta. Ele fala da imprensa e faz um curto comentário sobre a publicação da foto de Chico Buarque de Holanda.
 

Ombudsman - O senhor reclamou nesta semana que os jornais manipularam uma entrevista sua. O que ocorreu?
Gilberto Gil -
O jornalista me pergunta sobre os cortes do Orçamento: "O senhor está reclamando?". Eu digo: "Não, não estou reclamando". E sai uma reportagem com manchete dizendo que estou reclamando. Eu não estava reclamando. Eu estava dizendo como o corte afeta o Minc e como todo processo orçamentário tem problemas.

Ombudsman - Mas as suas observações posteriores não continham um inconformismo com o corte?
Gil -
Tudo bem, mas botem as minhas declarações. Se eu estou declarando que não estou reclamando, vocês que julguem se faz sentido dizer na manchete que estou reclamando. A primeira frase que eu disse aos repórteres foi: "Não estou me queixando de nada". Há reclamações com relação ao Orçamento? Há. Vários ministros estão nesta situação, mas eu não sou um deles. Estou sendo sendo realista apontando os problemas causados pelos cortes.

Ombudsman - Como o sr. entende o trabalho da imprensa?
Gil -
É difícil dizer. A imprensa, como qualquer outro segmento no mundo da informação, está submetida a várias lógicas. A lógica da política, do mercado, dos interesses, dos espaços ideológicos. Por mais que ela queira um distanciamento absoluto, e é compreensível que ela queira, não é possível ter. Os jornais tem donos, as redações tem pessoas, cidadãos, há subjetividades políticas, culturais.

Ombudsman - E ela é boa?
Gil -
É boa. No geral. Não é pior, com certeza, que o conjunto da imprensa mundial.

Ombudsman - Recentemente o senhor se deixou fotografar pela Folha sendo depilado. Alguns leitores criticaram o jornal por ter publicado a foto na primeira página...
Gil -
E alguns criticaram a mim mesmo.

Ombudsman - Como o senhor analisa esse caso?
Gil -
Isso é da minha liberdade. Era do meu direito deixar ou não. E se eu me deixei fotografar, era do direito de quem fotografou publicar. E ponto. Como Caetano, eu também gosto de um pouco de frescura.
Posso ser ministro, mas também sou um cidadão, também sou desse mundo da subjetividade. Eu formo a minha própria identidade. Estar sendo depilado na festa do carnaval também tinha um contexto. Estava na festa.

Ombudsman - Alguns jornais publicaram uma foto do Chico Buarque na praia do Leblon beijando uma amiga.
Gil -
Aí eu já acho que é voyeurismo e intromissão. Ainda que suave. Mas é diferente de mim, que fui solicitado por uma repórter a ser fotografado na minha intimidade e admiti. A intimidade você abre ou não abre. É uma opção sua. No caso do Chico, não. É uma outra história.


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