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OMBUDSMAN
Goela abaixo
BERNARDO AJZENBERG
É recomendável que o assunto principal hoje, dia do
primeiro turno, seja a democracia. Mas democracia não é só
eleição.
Na quarta-feira, dia 2, enquanto as atenções do país se
voltavam para os últimos momentos de campanha eleitoral, o
"Diário Oficial da União" publicou uma medida provisória
(MP) que regulamenta a participação de capital estrangeiro, até
o limite de 30%, nas empresas
jornalísticas e emissoras de rádio
e TV do país.
O princípio dessa participação
tinha sido aprovado no Congresso, em maio, numa emenda
constitucional. Aguardava-se,
desde então, que seu detalhamento fosse definido pelos parlamentares com base num projeto
de lei.
Porém, a cinco dias das eleições -como ressaltou a Folha
ao noticiar a medida quinta-feira-, o governo federal, de modo
surpreendente, optou por baixar
as regras via MP, um instrumento legal que faz com que a regulamentação entre em vigor, sem
discussão, imediatamente.
Se quando da aprovação da
emenda constitucional o debate
foi escasso, desta vez ele simplesmente inexistiu, sendo o assunto,
no entanto, essencial para os interesses de toda a sociedade.
O direito à informação, afinal,
é um instrumento de exercício
da cidadania. A forma como se
disciplina a estruturação dos
meios de comunicação, por isso,
diz respeito a uma das formas de
como se exerce a democracia. É
assunto público, não privado.
Pressão
Disse o ministro das Comunicações, Juarez Quadros, que se
recorreu a uma MP devido ao
caráter de "relevância e urgência" da matéria. Relevância, sem
dúvida. Mas urgência... para
quem?
Quase todos os grupos de comunicação eram favoráveis a se
aprovar o quanto antes a regulamentação, pois ela abre as portas, em tese, para que as dificuldades econômicas do setor
-sem dúvida profundas, graves- sejam pelo menos diminuídas.
Segundo publicou a Folha na
quinta, no entanto, dois grupos,
Abril e Globo, "eram os que mais
desejavam uma medida imediata do governo, via MP", por já estarem em negociação com investidores estrangeiros.
Aguardar que o assunto tramitasse como o previsto, no Congresso, levaria sua resolução para o ano que vem -e tais negociações poderiam ir por água
abaixo. Daí a urgência...
Você, leitor, acha que se justifica o uso de uma MP, um instrumento excepcional, neste caso?
Ao adotar esse expediente, não
estaria o governo atendendo, na
verdade, à urgência de negócios
privados de um ou dois grupos
numa matéria complexa e delicada que diz respeito diretamente a interesses da sociedade?
Pode-se argumentar que o
Congresso tem o poder de, ao fim
e ao cabo, derrubar a MP. Ela,
entretanto, já está em vigor, e
ninguém em sã consciência imagina que, em nome da ampliação do debate público e democrático sobre os diversos pontos
da regulamentação, a maioria
dos parlamentares toparia agora
"peitar" os grupos de mídia diretamente envolvidos na pressão
pela sua antecipação.
Apesar de toda a imprensa se
ter posicionado repetidamente,
durante anos, em editoriais, contra o uso abusivo e antidemocrático de medidas provisórias pelo
Executivo, desta vez não vi um
único comentário a esse respeito.
"O Estado de S.Paulo" e o "Jornal do Brasil" publicaram sexta-feira editoriais de boas-vindas à
regulamentação, mas passaram
ao largo da forma como ela veio.
"Criticar a edição indiscriminada de MPs em questões
alheias é um dever cívico, mas,
quando se trata de assunto nosso", parece ter pensado a mídia,
"tudo bem".
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Bernardo Ajzenberg é o ombudsman da Folha. O ombudsman tem mandato
de um ano, renovável por mais dois. Ele não pode ser demitido durante o exercício do cargo e tem estabilidade
por seis meses após o exercício da função. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva do leitor
-recebendo e verificando as reclamações que ele encaminha à Redação- e comentar, aos domingos, o noticiário
dos meios de comunicação.
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