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OMBUDSMAN
O anúncio que incomoda
MARCELO BERABA
As reclamações já vinham havia tempo. Mas
aquela foi diferente. Enviada domingo passado por e-mail e assinada por Oscar Strauss Filho, a
mensagem resume a irritação de
vários leitores: "Levantei e esperei a chegada do meu jornal. Desensaquei o exemplar no caminho para a poltrona e de pronto
arranquei e amassei aquele abominável meio encarte de propaganda. Infelizmente, a página
A15 foi junto, e eu hoje não vou
ler o artigo do sr. Josias de Souza".
O leitor se referia à edição da
Folha de domingo, que vinha
com a primeira página semicoberta por uma meia capa em papel brilhante com o anúncio de
uma nova linha de alimentos para cachorros.
O recurso publicitário não é
novo nem exclusivo da Folha.
Quase todos os jornais o utilizam, e há bastante tempo. Embora incômodo, o leitor parece
ter se acostumado, e são poucas
as reclamações, quando é possível descartar o anúncio. Mas,
quando a penúltima página do
caderno traz reportagens ou coluna, como ocorreu no domingo
passado e em várias outras ocasiões, os leitores se irritam. Eles
não gostariam de se livrar da página com informações jornalísticas mas, ao mesmo tempo, não
conseguem lê-la direito porque
lhes escapa. "Como é desajeitado
manusear o jornal com aquela
meia primeira página", resumiu
o leitor.
Antes de dar minha opinião
sobre o caso, vou colocar algumas questões que considero importantes para reflexão.
Anúncio é renda. Os jornais
têm duas fontes principais de
sustentação: a venda de exemplares (em bancas ou através de
assinaturas) e a publicidade
(venda de anúncios e classificados). Essas receitas se eqüivalem.
Se não houvesse publicidade, o
preço do jornal seria absurdo.
Há uma disputa muito grande
entre os diversos meios de comunicação pelas verbas publicitárias, e os jornais vêm perdendo
terreno. Já tiveram uma participação de 28% no bolo publicitário (em 95). No ano passado, o
percentual caiu para 18,6%, enquanto as verbas continuam a
correr para as televisões, que
concentram 60,4%. O resto do
bolo está dividido entre revistas,
rádios e outros veículos. A fonte é
o Projeto Inter-Meios (www.projetointermeios.com.br).
Os jornais têm, portanto, que
se mexer. Devem oferecer eficiência (de venda) e criatividade
para os seus anunciantes.
Anúncio é informação. Pesquisa da Ipsos-Marplan
(www.anj.org.br) encomendada
por 16 diários, entre eles a Folha,
mostrou que o índice de leitura
de anúncios e classificados
(74%) só perde para a primeira
página (86%) e o noticiário local
das cidades (85%). Realizada
em julho de 2003 com 960 pessoas de 11 cidades que haviam lido jornais nos três meses anteriores, a pesquisa mostra que os
jornais são mais usados que outros meios na decisão de compras porque permitem a comparação de preços e de características de produtos, principalmente
de varejo.
Faz sentido, portanto, que
anunciantes de produtos para
animais de estimação ou de celulares procurem os jornais e que
os jornais se desdobrem para
agradá-los.
Mas e o leitor? Ele não recusa
inovações ou anúncios criativos.
O que o incomoda é qualquer
coisa que dificulte a leitura do
jornal. Nesses casos, reclama, e
com toda a razão. O jornal tem
de usar o bom senso nessas horas
para conciliar os seus interesses
com os dos anunciantes e, principalmente, os dos leitores.
O superintendente da Folha
Antonio Manuel Teixeira Mendes explica que em várias ocasiões o jornal vetou a publicação
de anúncios que deturpavam o
projeto gráfico do jornal ou que
atrapalhavam a sua leitura.
Em relação à sobrecapa, a secretária de Redação da Área de
Edição da Folha, Suzana Singer,
explicou que "existe um esforço
do setor comercial, a pedido da
Redação, para vender todas as
páginas que fazem parte da sobrecapa". Foi o que aconteceu na
edição de ontem, que trouxe
anúncios de celulares e DVDs.
Teixeira Mendes confirma essa
orientação da Redação: "A área
comercial tem como política tentar colocar anúncios na contracapa e na página interna da sobrecapa, evitando assim problemas. Infelizmente, no domingo
não foi possível. Há preocupação
em ocupar a contracapa com
anúncio".
O que se deduz dessas explicações é que o jornal deverá continuar a aceitar o anúncio que cobre parcialmente sua capa. E o
nosso leitor, espero, voltará a ler
a coluna do Josias de Souza.
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Marcelo Beraba é o ombudsman da Folha desde 5 de abril de 2004. O ombudsman tem mandato de um ano, renovável por mais dois. Não pode ser demitido durante o exercício da função e tem estabilidade por seis meses após deixá-la. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva dos leitores, recebendo e verificando suas reclamações, e comentar, aos domingos, o noticiário dos meios de comunicação.
Cartas: al. Barão de Limeira 425, 8º andar, São Paulo, SP CEP 01202-900, a/c Marcelo Beraba/ombudsman,
ou pelo fax (011) 224-3895.
Endereço eletrônico: ombudsman@uol.com.br. |
Contatos telefônicos:
ligue (0800) 15-9000; se deixar recado na secretária eletrônica, informe telefone de contato no horário de atendimento, entre 14h e 18h, de segunda a sexta-feira. |
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