São Paulo, domingo, 15 de abril de 2001

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Um blefe, a mídia e a Sudam

A Folha começou a semana animada, com um "furo" na manchete de segunda-feira: "PT muda de tática e quer instalar CPI da Sudam". Com base em revelações da revista "Veja", o PT desengavetara um pedido de CPI só da Sudam. Nenhum outro jornal falava nisso.
No dia seguinte, todos anunciavam uma das maiores bombas da história recente do país: o rombo na Sudam, segundo o governo, passa do R$ 1,7 bi (batendo, de longe, o valor desviado da obra do TRT-SP, por exemplo).
Sobre a CPI, só a Folha era otimista. "O PT obteve as assinaturas necessárias para pedir a CPI e as adesões suficientes para votar a proposta em regime de urgência na Câmara...". "O deputado Babá (PT-PA) concluiu há duas semanas a coleta de 265 assinaturas de apoio para o pedido de urgência...".
"O Globo" informava que "nem mesmo os líderes dos partidos de oposição acreditam na possibilidade de instalação de uma CPI da Sudam". A base para essa afirmação estava na impossibilidade prática de essa CPI superar os obstáculos burocráticos e trâmites regimentais que se levantavam contra ela.
Laconicamente, na quarta-feira, o anúncio, em Primeira Página: "Pedido de urgência para CPI da Sudam é arquivado". Motivo: das assinaturas coletadas pelo deputado Babá, simplesmente 16 eram de deputados licenciados e 5 eram repetidas. Em palavras claras: a Folha estava mal-informada e se deixara levar por um blefe. Não soube checar as afirmações dos deputados petistas e as reais chances de viabilização da CPI-Sudam.

Onde estava a imprensa?
Mas nem só de blefes viveu o caso Sudam -e aqui o assunto ganha mais gravidade. Pois a verdade é que a bomba do rombo de R$ 1,77 bi surpreendeu a própria imprensa. Por quê? Porque ela não soube -ou não quis- ir atrás de um escândalo que passou na sua frente.
Pesquisa na Folha desde 94 mostra que a Sudam frequentou pouco suas páginas. Só em dezembro de 95 noticiou-se algo, sobre vantagens a políticos na liberação de verbas.
Em 96 e 97, nada. No começo de 98, reportagens prenunciavam o caos ("Receita vê fraudes em projetos da Sudam", em 18 de janeiro, por exemplo), mas logo sumiram.
O cavalo mais importante passou selado em 11 de maio de 99, na nota "Telhado de vidro" do Painel S/A: "A CPI dos Bancos, que já não influencia mais o mercado financeiro, pode se voltar contra os políticos. Quem viu um dos últimos dossiês que apareceram em Brasília conta que há revelações sobre os negócios que o senador Jader Barbalho (PMDB-PA) teria com a Sudam". Alguém montou no cavalo? Tudo indica que não.
O leitor teve de esperar até novembro de 2000 para algo sobre o tema ressurgir. Foi a série assinada por Josias de Souza, da sucursal de Brasília, sobre desvios, numa situação em que a Polícia Federal, diga-se, já armara "grampos" no caso.
Onde esteve a imprensa esses anos todos em relação à Sudam? Seriam, a apatia e a ausência de verve investigativa, frutos que o advento do tucanato ao poder gerou nos meios de comunicação, em especial na Folha?


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