São Paulo, domingo, 25 de janeiro de 2009 |
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Depois do mal feito...
UM TRECHO do discurso de posse de Barack Obama na terça-feira: "Vamos restaurar a ciência a seu lugar de direito e empregar as maravilhas da tecnologia para elevar a qualidade da saúde e reduzir seus custos. Vamos atrelar o sol, os ventos e o solo para proverem combustível para nossos carros e nossas fábricas. E vamos transformar nossas escolas, nossas faculdades e universidades para que façam frente às demandas de uma nova era. Tudo isso nós podemos fazer. E tudo isso nós vamos fazer". A ciência e a inovação tecnológica são fundamentais não apenas por serem uma das maneiras de o ser humano revelar o que tem de melhor em sua natureza mas também por constituírem fator determinante para acelerar a produtividade e, com ela, o progresso econômico e social das nações. Na quinta-feira, a Folha publicou notícia do corte pelo Congresso de 18% no orçamento para 2009 do Ministério da Ciência e Tecnologia e a reação indignada do setor. Este jornal tem tradição antiga e consolidada de cobrir bem assuntos relativos à ciência. A prioridade que dá ao tema é indiscutível, ao contrário da educação, que já foi muito importante para ele, mas parece ter deixado de ser (incoerência a ser resolvida). O jornalismo científico é uma especialização que tem sido muito estudada em diversos países. Sua importância decorre da relevância que a ciência tem para a sociedade. Quando bem praticado, esse gênero jornalístico dissemina informações sobre pesquisas em andamento ou concluídas, a importância de inovações tecnológicas para indústria, comércio e serviços, esclarece conceitos. Ele educa, democratiza o conhecimento. Embora em geral faça um bom trabalho no acompanhamento da produção científica, o jornal padece nessa área de um mal comum a diversas outras no que diz respeito à formação de políticas públicas referentes a elas. A Comissão Mista do Orçamento do Congresso Nacional, que resolveu o corte, não se reúne em sigilo. Sua pauta e agenda são públicas. Qualquer cidadão, inclusive jornalistas, tem acesso a elas. De setembro a dezembro, ela realizou diversas sessões. Só depois que a decisão foi tomada o assunto apareceu aqui. Quando a divulgação da ameaça de corte poderia ter alertado entidades e indivíduos para se mobilizarem a fim de impedi-lo, nada ou quase nada se publicou a respeito. É mais um exemplo de como é ineficaz e burocrática a maneira como o jornal cuida dos assuntos do Congresso Nacional. Não faltam espaço e repórteres para ouvir conversa fiada e reproduzir declarações cínicas que só interessam aos que as fazem. O diz-que-diz inconsequente, as pequenas fofocas, os balões de ensaio de deputados e senadores em busca de cargos e poder, para estes há sempre lugar nestas páginas. Mas colocar alguém para acompanhar sistematicamente o trabalho das comissões, na de Orçamento, por exemplo, e verificar se absurdos como esse corte estão sendo perpetrados contra o interesse público, isso o jornal não faz. Próximo Texto: Sobre cegos, jovens e jornais Índice Carlos Eduardo Lins da Silva é o ombudsman da Folha desde 22 de abril de 2008. O ombudsman tem mandato de um ano, renovável por mais dois. Não pode ser demitido durante o exercício da função e tem estabilidade por seis meses após deixá-la. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva dos leitores, recebendo e verificando suas reclamações, e comentar, aos domingos, o noticiário dos meios de comunicação.
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