São Paulo, domingo, 28 de julho de 2002

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Pratos quentes

O assunto que mais gerou mensagens ao ombudsman, na semana, foi o episódio do desentendimento ocorrido na sexta 19, em almoço na Folha, entre o candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, e o diretor de Redação, Otavio Frias Filho.
Segundo relata o jornal de quinta-feira, Lula resolveu deixar o recinto onde ocorria o evento por se sentir "irritado" diante de duas perguntas feitas "com veemência" por Frias Filho (uma sobre o preparo intelectual do candidato, outra sobre a aliança com o PL).
O incidente fora divulgado no início da semana por três colunas políticas (de penetração relativamente restrita).
Na quarta-feira, "O Globo" publicou reportagem sobre o caso, inclusive com declarações do diretor de Redação.
Até a edição de quinta, a Folha limitara-se a registrar a visita de Lula e o almoço, como de praxe, no Painel (pág. A4) de sábado.
A existência desses encontros, hábito em jornais de grande porte no mundo todo, é legítima.
Faz parte do relacionamento entre a empresa que edita o veículo e as autoridades (políticas, intelectuais, econômicas, culturais, científicas etc.).
Resulta, em última instância, num produto jornalístico mais bem informado para o leitor.
Ao mesmo tempo, não deve surpreender que haja, às vezes, rispidez entre jornalistas e autoridades, anfitriões e convidados, embora seja obviamente lamentável quando isso "extrapola".
Mas as consequências práticas disso só seriam nefastas, para o leitor, se os sopapos verbais se traduzissem, depois, em alteração na linha editorial do veículo de comunicação.

Divulgar ou não
Houve leitores indignados com a postura do diretor de Redação, outros com a atitude de Lula, outros com o fato de a Folha não ter divulgado de imediato o entrevero e outros, por fim, lamentando que se tenha feito a revelação, já que se tratou de uma rusga em evento privado cujo conteúdo o jornal se compromete a não divulgar.
Em termos estritamente jornalísticos, porém, o mais relevante, aqui, é discutir se e quando a Folha deveria (ou não) ter dado a seus leitores conhecimento do ocorrido.
Como escrevi em crítica interna na quarta-feira, penso que deve ser preservado o chamado "off" desses encontros, compromisso assumido pelo jornal com os convidados.
É só desse sigilo inicial que podem surgir, eventualmente, em tais almoços, pautas importantes de interesse do leitor a serem investigadas.
Pareceu-me certa, por isso, a Folha, ao não tornar público o bate-boca privado.
Diante do "vazamento" da informação, porém, mesmo que por colunas políticas de penetração restrita, tornava-se obrigatório dar satisfação a seus leitores. E isso deveria ter sido feito, penso, já na quarta-feira, sem esperar pela divulgação no "Globo".
Apesar do atraso, o texto que apresenta na quinta-feira o ocorrido (precedido, como ele próprio explicita, de convite à assessoria de Lula para que também ali se pronunciasse) foi um sinal de transparência.
Visto não ter ocorrido depois, ao menos até o momento, contestação por parte do PT ao ali descrito, presume-se que revela, sinteticamente, o que de fato aconteceu.



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