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O rolo compressor
Que poder ainda resta aos tradicionais meios de comunicação (jornais, rádios,
revistas e TVs) na formação da opinião
pública e na opção eleitoral?
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TERMINADA A CAMPANHA eleitoral, é de se
imaginar que os ânimos
arrefeçam e que, aos poucos,
seja possível uma avaliação
menos passional do papel da
imprensa nesta eleição presidencial. Há questões que ficaram no ar a exigir de jornalistas, leitores, institutos de monitoramento e da academia,
superadas as emoções, estudo
e reflexão.
Uma primeira questão é a
da influência: que poder ainda
resta aos meios tradicionais
(rádios, jornais, revistas e
TVs) na formação da opinião
pública e na opção eleitoral?
Os palpites oscilaram conforme o humor dos fregueses.
Houve quem tenha visto nos
meios os protagonistas de um
golpe contra a reeleição do
presidente Lula. E houve, não
necessariamente outros, os
que chegaram à conclusão de
que os meios tradicionais já
não têm qualquer importância. Amordaçá-los ou depreciá-los?
E a internet e os blogs, que
papel tiveram de fato? O jornalista Luís Nassif, por exemplo, avaliou que estas eleições
marcaram "definitivamente o
fim do poder absoluto da
grande mídia sobre o mercado
de opinião brasileiro". Será
que havia antes um poder absoluto? E será que o poder que
tinha realmente chegou ao
fim?
A esperança é a de que, com
um pouco de distanciamento,
consigamos fugir dos extremos e seja possível entender
que papel a imprensa está tendo e que erros e acertos cometeu.
O próprio presidente da República e os caciques da oposição contribuíram decisivamente para um entendimento
confuso do papel da imprensa
numa democracia, como a
nossa, em construção. Ora os
ataques reativos ao noticiário
negativo beiraram a irresponsabilidade, ora o rito e as circunstâncias os obrigaram a
reafirmar seus compromissos
democráticos.
A campanha eleitoral praticamente ignorou um outro
ponto importante, o da (alta)
concentração dos meios de
comunicação e seus corolários
(como a democratização dos
meios e a discussão regulamentação versus auto-regulamentação).
É um assunto que incomoda
os veículos e os candidatos.
Houve uma pergunta pertinente, em um dos debates,
mas as respostas foram insatisfatórias, e o assunto morreu
ali. Quanto mais clareza houver em relação a esta discussão, melhor para a imprensa e
para a sociedade. Não é possível adiar o assunto indefinidamente.
Dupla exposição
E há um terceiro aspecto da
cobertura que também merece a atenção. O instituto da
reeleição desequilibrou a cobertura jornalística, independentemente da posição dos
jornais em relação aos candidatos. O candidato na Presidência leva uma vantagem sobre os outros que nem mesmo
uma linha editorial mais crítica é capaz de atenuar.
Esta questão já havia sido
percebida pela ombudsman
Renata Lo Prete em 1998,
quando Fernando Henrique
Cardoso disputou a reeleição
contra, entre outros, Lula e
Ciro Gomes.
Ao comentar o resultado da
medição de espaço que cada
candidato teve na Folha, Lo
Prete concluiu, diante da acachapante supremacia de
FHC: "O resultado é um rolo
compressor". O rolo se repetiu em 2006 com Lula.
Tenho os levantamentos
das coberturas da Folha nos
primeiros turnos de 1998 e
2006. Não se pode comparar
os dois totalmente porque foram feitos por institutos diferentes, mas seus resultados
indicam uma tendência.
Os dois institutos adotaram
o mesmo critério de medir separadamente o noticiário da
Presidência do relativo à candidatura. Sob o ponto de vista
acadêmico e para se entender
o comportamento da imprensa, a divisão é justificada. Mas
sob o ponto de vista do acompanhamento do leitor, a separação na prática não existe. O
noticiário da Presidência se
confunde com o da campanha
e o da campanha contamina a
Presidência -como vimos em
1998, com a crise econômica,
e em 2006, com os escândalos
policiais.
Em 1998, o Datafolha monitorou o período entre 18 de
agosto e 2 de outubro. A Presidência teve 54% do espaço, o
candidato FHC teve 29%, Lula teve 13% e Ciro Gomes, 9%.
Se somamos a dupla exposição de FHC, ele teve 83% do
espaço eleitoral. Independentemente do teor crítico das reportagens, foi um "rolo compressor".
Em 2006, o Doxa (Laboratório de Pesquisas em Comunicação Política e Opinião Pública, do Iuperj) fez um acompanhamento mais extenso, de
1º de fevereiro, quando as candidaturas ainda não estavam
definidas, até 1º de outubro. O
resultado é mais equilibrado
do que o de 1998, mas mesmo
assim é visível a vantagem do
candidato-presidente: Lula
presidente ocupou 32% do espaço eleitoral e Lula candidato, 30%; Geraldo Alckmin,
29%, e Heloísa Helena, 8%. A
soma de Lula é de 62%.
São dados que confirmam,
na opinião de Alessandra Aldé,
pesquisadora do Doxa, "o caráter plebiscitário da reeleição,
quando tudo gira em torno do
candidato que está no cargo".
Para o cientista político Marcus Figueiredo, coordenador
do Doxa, mesmo quando parte
do noticiário é negativo, a vantagem é do presidente, porque
tem visibilidade em dobro.
Estes dois levantamentos
mostram também como o jornal é bastante crítico na cobertura dos fatos do governo e
busca mais equilíbrio na cobertura das candidaturas. Em
1998, 40% do que foi publicado
pela Folha sobre FHC presidente foi negativo, enquanto
47% foi neutro e 13% positivo.
No auge da crise econômica, o
jornal chegou a publicar, às
vésperas da eleição, um editorial na Primeira Página
-"Tempo esgotado".
Agora, em 2006, segundo o
Doxa, 40% do noticiário relativo a Lula presidente foi negativo, contra 41% neutro e 19%
positivo. A discussão do que é
positivo, negativo e neutro é
interminável e é bem possível
que os institutos apliquem critérios um pouco diferentes,
mas as tendências, como disse,
coincidem.
O mesmo ocorreu em relação às candidaturas. Em 1998,
FHC candidato teve 26% de
noticiário positivo e 29% de
negativo e Lula teve 30% de
positivo e 26% de negativo. No
primeiro turno de 2006, Lula
candidato teve 28% de positivo e 30% de negativo e Alckmin teve 28% de positivo e 29% de negativo.
Não pretendo com estas observações provar qualquer tese. São apenas alguns aspectos
da cobertura jornalística que, a
meu ver, merecem atenção.
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Marcelo Beraba é o ombudsman da Folha desde 5 de abril de 2004. O ombudsman tem mandato de um ano, renovável por mais dois. Não pode ser demitido durante o exercício da função e tem estabilidade por seis meses após deixá-la. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva dos leitores, recebendo e verificando suas reclamações, e comentar, aos domingos, o noticiário dos meios de comunicação.
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