São Paulo, domingo, 30 de julho de 2006

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OMBUDSMAN

Marcelo Beraba @ - ombudsman@uol.com.br

Nas mãos da CPI

A imprensa já poderia ter tirado a conclusão de que é impossível confiar nas informações das CPIs enquanto elas não são oficializadas

MANCHETE da Folha de terça-feira: "CPI diz ter provas contra 80% dos investigados". Ou seja, a CPI dos Sanguessugas, que investiga acusações de fraudes nas compras de ambulâncias com recursos públicos, tinha provas contra cerca de 90 parlamentares. Manchete de sexta-feira: "CPI diz agora que só tem provas contra 30 parlamentares".
A imprensa já poderia ter tirado uma conclusão dos trabalhos das CPIs: é impossível confiar nas informações enquanto elas não são oficializadas. Melhor, enquanto não estão aprovadas nos relatórios finais. Até lá, a divulgação das informações está sujeita a interesses pessoais, políticos, partidários ou, como neste momento, eleitorais.
Isso torna o trabalho jornalístico ainda mais difícil. Os meios têm de saber lidar com duas forças que freqüentemente os espremem: a obrigação de produzir um jornalismo vigilante em relação aos poderes públicos (e esse compromisso não pode ser abandonado num país como o nosso, com carência de recursos e altas taxas de corrupção) e a necessidade de não cometer injustiças, de não denegrir, de não expor as pessoas sem provas. A primeira força exige ação; a segunda, cautela. Não são incompatíveis. O bom jornalismo está na produção de reportagens documentadas que possam ajudar a sociedade e o país a se precaverem contra a corrupção.
Os jornais não têm como deixar de publicar informações oficiais, as que são assumidas publicamente pelos parlamentares que têm cargos nas CPIs. Mas:
1 - Deveriam ter frentes de investigações jornalísticas próprias que os permitissem confirmar ou questionar com segurança as informações que passam para os seus leitores. No caso dos sanguessugas, mais uma vez os jornais têm poucas investigações próprias e dependem dos informações repassadas pelos deputados.
2 - As informações não comprovadas, mesmo as oficiais, devem merecer dos jornais o mesmo tratamento de destaque que tiveram quando foram publicadas como se fossem fatos. Como fez a Folha na sexta-feira, com a manchete que redimensionou as provas colhidas pela CPI dos Sanguessugas.
3 - Deveriam ter mais cuidado com as informações vazadas pelos parlamentares, ou seus assessores, que não se deixam identificar. Nesses casos, não deveriam ter pressa. Mais vale o jornal levar alguns dias para confirmar uma informação do que publicá-la de qualquer jeito para não perder a exclusividade. Já temos um longo histórico de notícias originadas nos bastidores anônimos das CPIs e publicadas com destaque que nunca se confirmaram.
Isso vale também para notícias saídas sem identificação de fontes do Ministério Público e das polícias.


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Marcelo Beraba é o ombudsman da Folha desde 5 de abril de 2004. O ombudsman tem mandato de um ano, renovável por mais dois. Não pode ser demitido durante o exercício da função e tem estabilidade por seis meses após deixá-la. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva dos leitores, recebendo e verificando suas reclamações, e comentar, aos domingos, o noticiário dos meios de comunicação.
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