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Fernando Capez

As torcidas organizadas devem participar do Carnaval de São Paulo?

NÃO

Não querem samba, não querem festa

Para a imagem do Carnaval, patrimônio cultural do povo brasileiro, melhor que não participem.

Não que as escolas de samba ligadas a torcidas de futebol sejam um mal em si. Seus enredos são criativos, a música é de boa qualidade. Grande parte dos integrantes não tem ligação com as organizadas.

Carnaval é alegria, harmonia, congraçamento. Um período em que os espíritos se desarmam e até a criminalidade violenta declina. Não é o momento para discriminar ninguém ou para negar o direito de participar da festa. Escolas ligadas a torcidas organizadas já protagonizaram Carnavais memoráveis. Trazem muita alegria -mas só quando vencem.

Basta contrariar os seus interesses e a aparente felicidade se transforma em violência insana.

Elas não entendem a lógica do Carnaval. Trata-se de se divertir e de encarar a competição como uma motivação para se superar a cada ano e fazer o melhor. Realizar, na fantasia, o sonho que não se concretizou na realidade do cotidiano sofrido.

Essa não é a lógica dessas escolas. Estão ali para vencer, como se fosse um duelo com inimigos. Essa é a sua cultura, haurida no distante mundo do futebol. Essa é a visão dos seus dirigentes e do público que elas arrastam para o universo do sambódromo.

O torcedor de uma escola de samba ligada ao futebol é, antes de mais nada, um torcedor de futebol. Fanático por sua torcida -e um pouco também pelo seu time. Nada tem a ver com o ambiente do Carnaval.

Narcisistas, desejam ser os protagonistas do espetáculo. Como não têm grandeza de alma para partilhar, procuram se destacar pela violência. Não querem samba, não querem festa. Querem projetar a si próprios como temidos, violentos e poderosos.

Sem qualquer compromisso com a imagem do Carnaval, não se importam em agredir pessoas e em depredar patrimônio público ou alheio. Ao contrário, isso lhes dá especial prazer, pois confere a possibilidade de usufruir seu momento de glória.

No início da década de 2000, às vésperas do Carnaval, integrantes do bloco carnavalesco Tricolor Independente, liderados pelo seu presidente, mataram a socos e a pontapés um carnavalesco da escola adversária -digo, inimiga. Os assassinos foram condenados e cumprem reclusão de 12 anos. Mataram a pobre vítima e também o Carnaval.

Torcidas organizadas foram processadas e extintas pela Justiça. Atualmente, as remanescentes assinaram Termo de Ajustamento de Conduta com o Ministério Público, e a torcida envolvida será punida em cumprimento ao compromisso que assinou, respondendo pelas consequências dos seus atos.

Além disso, a liga paulista precisa expulsar, por tempo indeterminado, as escolas envolvidas na trama que culminou com um vândalo roubando as urnas com os votos dos jurados, no dia da apuração. Quando voltarem, devem retornar ao grupo de acesso, não mais o principal.

A prefeitura deve cortar, por prazo indeterminado, o repasse da ajuda a essas escolas de baderna. Finalmente, as pessoas que protagonizaram o vexame devem arcar com perdas e danos materiais e morais. O montante correspondente aos lucros cessantes e aos danos emergentes ao Carnaval paulista pode ser quantificado, levando em conta o impacto no turismo, a perda de patrocínios, a retração do público etc.

Quem viola direito alheio responde nos termos da legislação civil e criminal. As escolas ligadas às torcidas devem ser punidas pelas ações dos seus dirigentes e torcedores. Se é para ser como no futebol, a escola deve ser punida pelo mau comportamento de sua torcida, exatamente como ocorre com os clubes nos torneios que participam. Essa linguagem elas entendem.

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