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Recuo na ditadura

Em raro lampejo de racionalidade, Rafael Correa, presidente do Equador, anunciou perdão para três diretores e um editor do jornal "El Universo" condenados a três anos de prisão e multa de US$ 40 milhões por publicar artigo que o chamava de "ditador".

O perdão também foi concedido aos dois autores do livro "El Gran Hermano" (O Grande Irmão). Eles haviam sido sentenciados a pagar multa de US$ 2 milhões por veicular denúncias contra o irmão do presidente, Fabricio Correa.

Rafael Correa demonstra, com o gesto, que se dobra à reação da opinião pública, em vários países, contra o gesto ditatorial de punir de modo tão desproporcionado os que o criticaram. Seu intuito nunca fora anular uma ofensa, mas calar quaisquer vozes independentes.

O repúdio à condenação generalizou-se. Poucos se deixaram iludir pelo fato de a punição violenta ter sido proferida pela Corte Nacional, órgão supremo da Justiça equatoriana. Assim como a Assembleia Nacional, a Corte se encontra sob a tutela da Presidência.

Correa sacrificou o equilíbrio entre os Poderes a golpes de consultas populares, que a Constituição de 2008 -escrita, votada e referendada sob a batuta de sua facção- lhe faculta convocar sobre os assuntos que julgar convenientes. Esse arremedo plebiscitário de democracia segue a trilha aberta pelos populistas em que Correa se espelha, Hugo Chávez, da Venezuela, e Evo Morales, da Bolívia.

O recuo do presidente, embora deva ser saudado como positivo, veio tisnado com vestígios da velha arrogância. "Há perdão, mas não há esquecimento", jactou-se. "A imprensa abusiva foi vencida."

Abusivas ou não, justas ou injustas, veementes ou até agressivas, críticas de todos os matizes constituem um teste de fogo para a índole democrática do governante. Tolerá-las, e respondê-las com fatos e argumentos (não punições), demonstra a capacidade do mandatário de conviver com os múltiplos juízos sobre seu desempenho.

É certo que, de ora em diante, os reparos ao Executivo no Equador serão represados pelo temor de pôr em risco a liberdade do autor ou a saúde financeira dos veículos.

A própria Constituição equatoriana garante, no artigo 18, o direito de "buscar, receber, trocar, produzir e difundir informação veraz, verificada, oportuna, contextualizada, plural e sem censura prévia acerca dos fatos, acontecimentos e processos de interesse geral".

Essa disposição libertária perde todo o valor quando o poder de julgar o cumprimento de tantos requisitos permanece concentrado nas mãos de uma só pessoa, ainda que eleita pelo voto.

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