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O papa em Cuba

Encontro de Bento 16 com Raúl Castro não sinaliza mudança profunda no regime ditatorial, mas uma convergência de interesses

Diferenças simbólicas e históricas distinguem a viagem do papa João Paulo 2º a Cuba, em 1998, da visita de Bento 16 à ilha.

O pontífice polonês sempre encarnou, pessoalmente, um símbolo de mudança. Fez carreira eclesiástica sob a vigilância do partido único em seu país e, mais tarde, foi um protagonista no vitorioso esforço para derrotar o comunismo na Europa.

Sua presença em Cuba, 14 anos atrás, revelava o enfraquecimento do regime castrista, que já não contava com a ajuda econômica da União Soviética e tentava mitigar seu isolamento internacional com uma visita de prestígio.

Bento 16 não teria como produzir efeito semelhante, nem seria de seu interesse. Enquanto o antecessor era um cruzado anticomunista com papel relevante na política internacional, o ex-cardeal Ratzinger, em seu pontificado, tem se voltado para problemas internos à igreja e à ortodoxia da fé.

Foi a Cuba, assim, para cuidar de seu rebanho e consolidar o espaço que a igreja tem ganhado no país -ora sob a tutela de Raúl Castro- desde a viagem de João Paulo 2º.

Até o final dos anos 90, os católicos cubanos não podiam sequer comemorar publicamente o Natal. Hoje Cuba conta com relativa liberdade religiosa, e o bispo de Havana é interlocutor importante para negociar mudanças lentas, graduais e seguras dentro do regime.

O pragmático Raúl Castro comanda reformas "chinesas" em seu país, com estímulos à atividade econômica privada e quase nenhum espaço para abertura política. É de sua conveniência manter abertos canais com uma instituição milenar, que não parece apressada em sua inegável defesa das liberdades individuais na ilha.

Não surpreende, portanto, que Bento 16 tenha sido cuidadoso ao se referir aos prisioneiros do regime, evitando chamá-los pelo nome: presos políticos. Em seus discursos, porém, não deixou de fazer elaborada defesa intelectual da liberdade, em todas as suas formas.

Ao longo da semana, a ditadura cubana permitiu e encorajou manifestações públicas de fé. No entanto, antes da visita papal, reforçou medidas que são praxe há mais de 50 anos para evitar protestos políticos: opositores e dissidentes foram encarcerados.

Parece ainda distante o dia em que Cuba, como Bento 16 disse desejar em seu discurso de despedida, venha a ser "a casa de todos e para todos os cubanos, onde convivam a justiça e a liberdade".

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