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Marina Silva

Disperso e insuficiente

O pacote de ajuda para a indústria nacional, premida pelos concorrentes internacionais pela alta carga tributária e o câmbio desfavorável, contou com uma variedade de medidas, da desoneração da folha de pagamento e do aporte de recursos do BNDES até a estímulos para tratar câncer. As reações foram diversas, mas o entendimento de que são dispersas e insuficientes prevaleceu.

Não alivia o que é chamado de "desindustrialização" e, menos ainda, inicia um processo de mudança. Os tempos são de aquecimento global e de crise permanente e, por isso, são necessárias medidas mais amplas e profundas.

Os problemas são conhecidos há anos: uma estrutura tributária ineficiente e injusta, baixa capacidade de poupança, sociedade ainda muito desigual, gargalos de infraestrutura e de capital humano.

Como alguém disse, a indústria brasileira é como uma criança de 60 anos, ou seja, os problemas se arrastam há muito tempo. Por que a reação só vem em momentos de crise? O que acontece nos intervalos?

O sistema político parece incapaz de enfrentar os enormes desafios que temos e a urgência da crise desperta o governo do torpor do dia a dia. Precisamos de um projeto de longo prazo. Que indústria sobreviverá ao século 21? Até aqui, o remédio adotado parece manter a doença em vez de tratar o paciente.

A desoneração da folha de pagamento é uma boa medida. Mas, quando restrita a apenas alguns setores, pode ser vista como privilégio. Se fica muito caro estender para todos, temos que discutir como compensar esse custo com eficiência econômica e justiça social, e isso só pode ser feito com uma reforma tributária. Então, esperamos uma crise para escolher discricionariamente quem fará jus ao alívio?

E o que pode ser dito em relação aos recursos no BNDES, com juros subsidiados, sem estímulos ao fomento do desenvolvimento sustentável e, pior, desconsiderando passivos ambientais e sociais? Os critérios de distribuição carecem de mais visibilidade, pois há custos para a sociedade: e quem paga mais é quem ganha menos, pois nosso sistema tributário é altamente regressivo.

A CNI anunciou que participará da Rio+20 para discutir sustentabilidade. Talvez, no debate contextualizado com a realidade do planeta, consiga achar novos caminhos se conseguir fugir à pauta economicista ditada pelo próprio governo.

O Brasil tem grandes vantagens comparativas. Abrigamos parte significativa da biodiversidade e da água doce existentes no planeta, grande extensão de terras cultiváveis, diversidade étnico-cultural, criatividade e uma capacidade empreendedora invejável. Mas faltam políticas estratégicas de longo prazo e disposição para abandonar uma atitude de complacência, mesmo quando as condições são mais favoráveis.

MARINA SILVA escreve às sextas-feiras nesta coluna.

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