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Eloisa de Sousa Arruda

Os sírios estão chegando

Nosso país foi construído por migrantes. A preocupação com a acolhida é uma continuação da prática solidária que sempre nos pautou é fundamental

De tempos em tempos, brasileiros incorporam sotaques e costumes estrangeiros. Somos um vasto país acolhedor. Basta olhar em volta. Está em cartaz, mais uma vez, a aventura do turco Nacib, seduzido pelos encantos de Gabriela no romance de Jorge Amado. Os jovens dos anos 70 foram cativados pelos dramas de Nino, italianinho que reinava na TV Tupi.

A tradição de aceitação do estrangeiro, arraigada até mesmo nas novelas, faz pensar que em breve possam surgir na telinha as desventuras de algum Mohammed. O nome, comum entre os sírios, começa a ser ouvido com mais frequência desde que aquele país mergulhou em uma crise de incalculáveis proporções.

Não há registro oficial de mortos na Síria. Fala-se em 17 mil. Cenário de guerra que levou o prêmio Nobel da Paz Kofi Annan a tentar negociar soluções. Deixou o posto alegando total falta de condições contra a intransigência do governo de Bashar Assad. A devastação só aumenta.

O Acnur, o escritório da Organização da ONU para refugiados, estima que 270 mil pessoas deixaram a Síria desde que a situação se agravou. As fronteiras vizinhas estão abertas por questões humanitárias. Nesse contexto, o Brasil ganha atenção. O país, aliás, está na rota dos desejos de estrangeiros, refugiados ou não, graças aos bons índices econômicos obtidos nos últimos anos, em oposição à maioria dos países ocidentais.

Por enquanto, o número de sírios que pediram refúgio no Brasil é pequeno. O Comitê Nacional para os Refugiados informa que recebemos 58 pedidos de asilo político desde março de 2011. A comunidade síria em São Paulo, por seu lado, já se organiza para receber compatriotas. Tem até página no Facebook para se comunicar com seus nacionais.

Como lembra o consulado sírio, a imigração síria ao Brasil é antiga e nunca foi contínua. Teria começado no início do século 19, e os primeiros imigrantes, bem acolhidos, naturalizaram-se. Estima-se que cerca de dois milhões de sírios vivem hoje no Brasil, boa parte em São Paulo.

Para a Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania, a questão é como ajudar povos em transição na construção de uma vida entre dois países e duas culturas. Vivem no Brasil cerca de 4.500 refugiados de 77 nacionalidades, quase a metade em São Paulo. Vêm principalmente da África, Oriente Médio e da América Latina. Chegam sem muitos recursos, fugidos de guerras e de perseguição política. Quando a liberdade é cerceada e a paz interrompida, resta a busca por ajuda internacional.

Nosso país foi construído por migrantes. A preocupação com a acolhida é uma continuação da prática solidária e humanista que nos pauta. Só no primeiro trimestre de 2012, foram quase 400 novos pedidos de refúgio. O número reforça a importância de oferecer auxílio aos refugiados, para que reconstruam suas vidas até que retomar a autonomia.

A Secretaria da Justiça reativou o Comitê Estadual de Refugiados. Sua função tem sido identificar necessidades. Um dos principais desafios é a falta de abrigos e moradias logo na chegada. Por isso a intenção de criar uma casa transitória para receber e dar esse atendimento.

Somos iguais, porém separados por fronteiras, línguas e costumes. Oferecer assistência é o nosso papel. Somos um povo hospitaleiro. Respeitamos os direitos humanos. Essa, sim, é uma missão do governo e da ONU, mas também é uma missão da sociedade brasileira e dos paulistas.

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