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Joaquim Falcão

TENDÊNCIAS/DEBATES

A cooperação financeira dos partidos

Não é natural, como alguns sugerem sobre o julgamento do mensalão, partidos diferentes se ajudarem com dinheiro. Se é assim, os eleitores têm de saber

Se o eleitor soubesse que o PT pagaria as contas dos outros partidos, como por exemplo PTB e PP, isso alteraria o voto dos eleitores?

Se o eleitor soubesse que existia uma cooperação financeira entre partidos que se apresentaram distintos, com propostas diferentes, e que concorreram entre si, isso afetaria o seu voto? Essa seria uma informação relevante? Essa pergunta é indispensável para entender o mensalão e suas consequências.

Uns dizem e com razão que alianças políticas são naturais. Sejam antes ou durante a campanha. Ou mesmo no meio do governo. Fazem parte da democracia. Nada de novo. Nem mesmo a distribuição de ministérios. É prática comum, sobretudo em democracias parlamentaristas. Inevitável no presidencialismo de coalizão que temos.

Outros, no entanto, fazem duas ressalvas. Primeiro, aliança ou cooperação política é distinta de cooperação financeira. Aquela é aceitável. Esta não.

Segundo, se a cooperação financeira foi para pagar dívidas de campanha, não de meio de governo, a cooperação já estava estabelecida antes da campanha. Donde deveria ter sido pública. Feita a céu aberto. No debate dos palanques e da TV.

Por que? Por razão simples. Essas alianças influenciam o voto do eleitor. Conhecê-las é, sim, informação relevante. Elas não devem ser ocultadas. O deputado é representante, e o eleitor o representado. O representado, o eleitor, precisa saber quem está pagando seu representante, o deputado.

Mas não existe nenhuma lei que obrigue os partidos a revelar esta cooperação financeira, defendem-se os réus. Pode até ser. Mas existe a presunção de boa fé, fruto da cultura democrática, que os deputados de um partido não são financiados por outro partido.

A moralidade exigida pela constituição não se instala depois das eleições, mas no correr do próprio processo eleitoral. Como o Supremo já decidiu no caso da Lei da Ficha Limpa.

O ministro Ayres Britto considera que o Estado democrático de Direito é o maior de todos os princípios constitucionais. Estrutura e orienta outros princípios e regras da constituição. A democracia exige um eleitor cada dia mais e melhor informado. Daí o horário eleitoral, os debates e o principio da publicidade da administração pública.

Caso confirmado o conjunto articulado de crimes e ilícitos através de cooperação financeira oculta, o dano maior não terá sido ao caixa do Banco do Brasil, do Congresso, do fisco ou do Visanet. Terá sido ao Estado democrático de Direito.

JOAQUIM FALCÃO, 69, mestre em direito pela Universidade Harvard e doutor em educação pela Universidade de Genebra, é professor de direito constitucional e diretor da Escola de Direito da FGV-RJ

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br

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