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2007, ano do clima
Estudo da ONU vai mostrar que seis dos sete anos mais quentes da história aconteceram na década em curso
NADA COMO uma transição no calendário para
convidar à reflexão.
Com a entrada do novo ano, avizinha-se outra data
aguardada com justificada expectativa: 2 de fevereiro, quando
virá a público o novo relatório do
Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC).
A cada cinco anos, o corpo de
2.500 especialistas reunidos pela
ONU publica uma revisão com o
estado da arte da pesquisa climatológica. O volume se torna então um vade-mécum de causas e
efeitos do aquecimento global.
Vale e é citado como evangelho,
exceto pela minoria de cientistas
que fizeram do ceticismo com o
efeito estufa sua profissão de fé.
Por ora se conhecem só as linhas gerais do documento, em
fase final de anotação por governos e cientistas. Versões preliminares têm sido reveladas pela
imprensa, como ocorreu recentemente no diário espanhol "El
País". O ponto crucial parece ser
o fortalecimento da certeza com
que se atribui a mudança climática à atividade humana.
O sistema do clima exibe ampla variabilidade natural e um
sem-número de influências causais -dos ciclos de atividade solar à emissão de gases por vulcões. Céticos profissionais exploravam ao máximo a incerteza
escrupulosamente registrada
pelos autores do IPCC. Tal margem de manobra deve agora ser
restringida: segundo o jornal espanhol, o texto cravará como
"muito provável" -acima de
90% de certeza- que gases-estufa produzidos pelo homem sejam os responsáveis pelo aquecimento observado nas últimas
cinco décadas.
O relatório deverá registrar fatos incontestes capazes de inverter a maré e arrastar a agenda internacional para a mudança climática planetária, de maneira
mais irresistível que o Protocolo
de Kyoto. Seis dos sete anos mais
quentes de toda a história registrada foram observados neste século 21. A concentração do gás-estufa dióxido de carbono é a
mais elevada em 650 mil anos; de
280 partes por milhão (ppm) no
início da era industrial, está em
380 ppm e deve chegar a 500
ppm em 50 anos.
As previsões do relatório encerram maior potencial para sacudir opinião pública internacional e governos da letargia inoperante. A temperatura média da
atmosfera deve subir entre 2C e
4,5C até o final do século, com o
valor mais provável de 3C. Perturbação bastante para deslanchar fenômenos extremos, como
furacões e secas devastadoras.
Ou para elevar o nível dos mares
em até 58 cm, por volta de 2100.
Há cada vez mais indícios de
que isso possa já estar ocorrendo, como a onda mortal de calor
de 2003 na Europa e a seca incomum na Amazônia em 2005. Se é
por falta de certezas que nada se
faz, eis aqui uma deveras preocupante: mesmo na implausível hipótese de a concentração atual
de gases-estufa na atmosfera ser
mantida, o que já seria catastrófico para a economia mundial, a
temperatura subiria ainda 0,5C,
por efeito inercial.
Seria auspicioso se 2007 entrasse para a história como o ano
em que a humanidade se rendeu
aos fatos básicos da física.
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