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A máquina do tempo
JOSÉ SARNEY
O velho Andrada, presidindo a Câmara dos Deputados, dizia, quando o
orador ia mal: "O tempo está esgotado. O tempo, o amigo". Se o orador ia
bem, mudava: "O tempo, o inimigo".
E o que é o tempo? A primeira das
mais fundamentais descobertas do
homem. Daniel Boorstin diz que "somente criando os meses, as semanas e
os anos, os dias e as horas, os minutos
e os segundos, pode a humanidade libertar-se da cíclica monotonia da natureza".
Cada ano que passa serve para contar a vida, contabilizar tristezas e alegrias, ganhar forças de esperança para
o futuro.
Mas não foi fácil descobrir como
contar o tempo. O universo funciona
na sua eternidade, com suas leis,
alheio à noção de aferição. É o silêncio
imperturbável, do qual saímos buscando referências. Primeiro a Lua, depois o Sol, os planetas, as estrelas.
A Lua foi a primeira referência, observando o seu ciclo. Os povos primitivos regulavam a vida pelas fases lunares; da lua nova à lua cheia. Era a
primeira medida do tempo.
Depois o homem precisava organizar um calendário para saber das estações, a época do plantio, do frio, da
caída das folhas, do desabrochar das
flores, do crescimento dos frutos; enfim, saber o mistério das estações.
Voltou-se para os astros, já que as fases pequenas da lua não lhe ofereciam
respostas seguras às suas necessidades. A descoberta de que a Terra girava ao redor do Sol deu a chave de uma
medida exata para contar os dias em
que nosso planeta voltava ao mesmo
lugar, completando sua órbita. Dezenas de calendários foram inventados:
para cada cidade, cada povo, cada país
e outros mais. E os dias da semana?
Foram descobertas recentes.
A Revolução Francesa (1789) nomeou uma comissão para elaborar
um calendário. Laplace fazia parte dela. Criou uma semana de dez dias, o
mês de 30, mas faltavam cinco dias
para fechar o ano cósmico de 365. Na
China, só em 1911 se introduziu o calendário gregoriano e, na Rússia, só
em 1940! Em 1929, a semana russa era
de cinco dias.
As festas religiosas geraram as primeiras necessidades de organização
de um calendário para compatibilizar
os textos bíblicos com a descoberta do
tempo (a Páscoa, a Paixão, o Natal).
Foi o papa Gregório 13 quem resolveu
a questão.
Faltava descobrir a máquina de medi-lo com exatidão. Começou com relógio de sol e sombra, de água, de vela, de peso, até Henrygens e Harrison,
um acusando o outro de plágio quanto à invenção da máquina de corda.
"Meu propósito, disse Kepler, é demonstrar que a máquina do universo
é uma máquina de relojoaria". É fascinante a história da incorporação do
tempo e do relógio ao mundo e às
nossas vidas.
Hoje, 1999, véspera do terceiro milênio, renovamos as mesmas crenças e
as mesmas saudações ao ano que chega. Nós inventamos os anos e hoje eles
são maiores do que nós e dominam o
nosso destino e espírito.
Em cada lugar, em cada relógio, o
Ano Novo marca, para cada homem,
em todas as latitudes, essa obra de
Deus, a obra da criação. Foi Ele quem
nos deu a graça da vida para os descobrimentos e a liberdade.
Ano bom, ano velho, que sejam
bons anos.
José Sarney escreve às sextas-feiras nesta coluna.
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