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ELIANE CANTANHÊDE
Múltiplas personalidades
PARIS - Há dois Lulas, ou muitos
Lulas. O deste momento, de crise
nos países ricos e de fórum de países pobres, é o Lula de esquerda,
que se vira de costas para Davos e de
frente para Belém.
Se fosse hora de crescimento
mundial, Lula certamente estaria
em Davos com os líderes dos países
desenvolvidos, enaltecendo a estabilidade e o ajuste fiscal. Como não
é, ficou no Brasil mesmo para se encontrar com Chávez, Evo Morales,
Rafael Correa e Fernando Lugo.
Ironizou "o deus mercado" e os
ricos, mandando o FMI ensinar a
Obama como gerir os EUA. E aproveitou para, apesar dos cortes no
Orçamento, prometer mais um milhão de habitações e ampliação do
Bolsa Família para os jovens. Ou seja: um olho na crise, outro na sua
popularidade hoje e na campanha
de Dilma Rousseff amanhã.
Esses dois Lulas, que se alternam
entre o Fórum Econômico e o Fórum Social, dividem opiniões. Como ficou claro num encontro de
jornalistas sobre América Latina na
Espanha, semana passada.
Em almoços e jantares, brasileiros criticavam o "oportunismo" e o
lado marqueteiro de Lula, sempre
tirando vantagem de tudo -inclusive dos êxitos alheios. Nas reuniões
plenárias e mesas redondas, espanhóis, argentinos, venezuelanos,
equatorianos... elogiavam a liderança política e o sucesso administrativo do Brasil e de Lula.
De onde, afinal, vem a boa fama
de Lula no mundo? De onde os jornalistas internacionais tiram tanta
simpatia por ele? Principalmente
da imprensa brasileira, que, por
exemplo, como tinha de ser, registrou todo o seu falatório e toda a sua
desenvoltura no Fórum de Belém.
Isso mostra como as notícias sobre Lula e seu governo têm imenso
espaço e repercussão, soterrando as
críticas. Tudo o que ele diz, faz, promete e anuncia tem destaque. O
resto fica confinado aos espaços de
análise e de opinião.
Está explicada, portanto, a azia
de Lula com a imprensa: ele chora
de barriga cheia, muito cheia.
elianec@uol.com.br
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