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São Paulo, sábado, 01 de março de 2003

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LICENÇA PARA MATAR

Momentos de crise são especialmente favoráveis ao aparecimento de propostas mirabolantes capazes de eliminar, num lance de mágica, impasses que gerações inteiras não foram capazes de resolver. É compreensível que as pessoas afligidas pela violência no Rio pressionem as autoridades exigindo soluções imediatas. O Poder Executivo deve responder às demandas agindo com firmeza, mas sempre em conformidade com as normas legais; os policiais devem combater o crime, mas não se igualar aos criminosos. O bandido atenta contra a lei; o policial, ao contrário, é o servidor da lei.
Muitas pessoas comuns ignoram essa distinção fundamental. Elas acreditam que o agente da lei deveria, para cumprir bem o seu dever, se transformar numa espécie de assassino -num carrasco que, por delegação sabe-se lá de quem, estaria autorizado a matar "quem tiver de ser morto". Segundo essa concepção errônea, a Polícia Militar deveria se converter num esquadrão da morte, eliminando pessoas más sem necessidade de nenhum trâmite jurídico.
Declarações recentes de autoridades do Rio, porém, sugerem que essa visão de mundo talvez tenha se infiltrado na cúpula da administração pública, que deveria zelar pelo respeito à legalidade. No dia 26, o prefeito do Rio, Cesar Maia, disse que, se ele fosse o governador quando da última rebelião em Bangu 1, em 2002, "não tinha conversa, não tinha negociação. Mandava entrar o Bope [Batalhão de Operações Especiais" e matava quem tinha que matar".
Essa observação infeliz talvez tenha induzido o secretário de Segurança Pública do Estado, Josias Quintal, a elevar o tom: "Nosso bloco está nas ruas e, se tiver que ocorrer conflito armado, vai ter. Se alguém tiver que morrer por isso, que morra". Fica a impressão de que, pressionadas pela população, as autoridades se vêem obrigadas a endossar as reflexões mais rasteiras sobre como combater a criminalidade. O Estado não pode resolver um problema crônico tomando o atalho da ilegalidade e se rebaixar até o nível de um criminoso.


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