São Paulo, terça-feira, 01 de março de 2005

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FOME NA RIQUEZA

O governo federal e o Estado de Mato Grosso do Sul devem ser responsabilizados por omissão no episódio das mortes, causadas por desnutrição, de crianças indígenas da comunidade caiuá. O primeiro caso letal ocorreu no dia 11 de janeiro. Todavia, apenas no último final da semana chegaram à área três médicos e quatro nutricionistas.
O Ministério do Desenvolvimento Social criou em 2003 o programa Fome Zero Indígena, com gestão a cargo dos Estados. O governo matogrossense-do-sul desde então gastou apenas R$ 1 milhão dos R$ 5 milhões que lhe foram repassados.
Tem-se a impressão de que o repasse é tratado pelo governo federal de modo burocrático -quando programas sociais precisam ser acompanhados e avaliados de perto e de maneira sistemática. É inaceitável que crianças morram de desnutrição sem que essa possibilidade fosse detectada com antecedência para que se tomassem as medidas adequadas.
O governo de Mato Grosso do Sul também deve explicações. É impossível levar a sério a tentativa de atribuir a culpa pelas mortes aos próprios índios, que resistiriam a submeter suas crianças a tratamento.
O episódio não deixa de ser mais uma lição no caminho tortuoso que o governo federal vem trilhando em suas iniciativas de combate à fome -bandeira eleitoral do então candidato Luiz Inácio Lula da Silva.
O país já assistiu ao bombástico lançamento do Fome Zero e à sua diluição no programa Bolsa-Família. Assistiu também equívoco numérico cometido pelo governo federal ao considerar que 44 milhões de pessoas viveriam no país em "estado de insegurança alimentar" -número que uma pesquisa do IBGE derrubou há pouco mais de três meses.
Agora, o Brasil assiste a essa tragédia tão emblemática de suas agudas contradições: crianças indígenas morrem de fome no Estado que é um dos celeiros de nossa rica produção de alimentos -e isso em pleno alvorecer do século 21.


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