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O que falta fazer
Confirmada a liberdade de pesquisa com células embrionárias, é hora de conter expectativas e investir com inteligência
ASSENTADA a poeira revolvida ao longo de
mais de três anos pela
Procuradoria Geral da
República e pelo Supremo Tribunal Federal (STF) acerca da
constitucionalidade da pesquisa
com embriões humanos, os estudos podem agora ser retomados.
Nem todos foram interrompidos, mas a insegurança gerada
pela hipótese de decisão negativa
mantinha em suspenso o financiamento de pesquisas. Todavia,
já se informa que brasileiros poderão produzir em meses a primeira linhagem nacional de células-tronco embrionárias.
Foi por muito pouco que a liberdade de pesquisa terminou
reafirmada em sua plenitude: 6
votos a 5. Um único sufrágio poderia ter condenado essa área
promissora a um novo e longo
período de indefinição.
O voto do ministro Carlos Alberto Direito retirou peso da
controversa questão religiosa e
concentrou-se em condições para que a permissão contida na
Lei de Biossegurança pudesse
ser considerada constitucional
em sua aplicação. Na prática, seria reinstaurada a insegurança.
Outros ministros seguiram o caminho, mas não em número suficiente para reverter o resultado.
Agora os pesquisadores se
apressam a desencorajar o excesso de esperança nas células-tronco embrionárias. De fato,
têm um longo percurso pela
frente. E o resultado que colherão ao final, como costuma acontecer com o investimento em
ciência, é de todo incerto.
Para se tornarem úteis em terapias regenerativas, é crucial
desenvolver métodos de controlar as células embrionárias. Não
se conhecem bem, ainda, os
meios tanto para desativar seu
potencial tumorígeno quanto
para obter as células diferenciadas (especializadas) para uso no
tecido ou órgão por tratar.
Há mais problemas a enfrentar. Um deles é o diminuto acervo de embriões disponíveis para
pesquisa, sem solução à vista
(dadas as limitações da lei brasileira). Outro está na concorrência das células pluripotentes induzidas, que parecem reunir a
versatilidade das embrionárias,
mas podem ser obtidas de células adultas. Afastam a necessidade de destruir embriões, mas as
próprias iPS, como são conhecidas em inglês, encontram outra
sorte de restrição ética, pois envolvem manipulação genética.
Por fim, cabe lembrar que não
basta a liberdade de pesquisa -é
preciso igualmente prover os
meios. Não só financiamento
mas um programa coordenado e
ambicioso para concertar os esforços dos laboratórios brasileiros na área. Embora o governo
tenha reduzido parte da burocracia, há ainda pendências para
simplificar a importação de equipamentos e reagentes de pesquisa biomédica, uma das principais
desvantagens competitivas dos
cientistas brasileiros.
O STF levantou uma barreira
ao estudo de células-tronco embrionárias, mas as terapias que
elas prometem não virão tão cedo. Parte dos obstáculos são inerentes à pesquisa e à complexidade da biologia; já os restantes
só dependem de maior prioridade para a ciência entre governantes e legisladores.
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