São Paulo, sexta-feira, 01 de julho de 2011

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JOSÉ SARNEY

Cruzado: 25 anos

Com o tempo, é possível ver o que significou para o Brasil o Plano Cruzado. Ele completou agora 25 anos.
Nenhum plano despertou tanta paixão: os especuladores de 1986 o odeiam e o povo consumidor não o esquece, pois foi a primeira grande distribuição de renda do Brasil.
Eu sabia dos riscos e perigos em fazê-lo, mas tive a coragem de congelar os preços e a taxa de câmbio, entre outras medidas. Abandonei a ortodoxia do FMI e da banca internacional.
Enfrentei-os. Derrotei-os, pois o Brasil, a partir dali, nunca mais seria o mesmo -nem o FMI também.
A Europa vive até hoje o que é o combate ortodoxo da crise de 2008. Desemprego em 20%, protestos em várias cidades e a agonia do Estado social -isto é, o direito do povo a saúde, educação, aposentadoria e seguridade social. Nasce o movimento do "indignai-vos", que varre e ameaça o velho continente contra a redução de salários e créditos.
O Plano Cruzado buscou a saída do mercado interno -a mesma que Lula usou em 2009-, barrou a especulação de preços e da moeda.
Ouvi do então governador do Rio de Janeiro, Leonel Brizola, ser a maior coragem de nossa história. O capital internacional nos cercou e o capital interno seguiu o seu exemplo. Foi uma guerra.
O Cruzado não foi somente um plano econômico. Foi um plano de consequências políticas que mudaram o país. Legitimou-me como presidente da República, e sem ele eu seria deposto, com retrocesso democrático à vista. Também possibilitou funcionar a Constituinte, que deu ao povo direitos sociais, garantias individuais, direitos do consumidor.
Paguei -e até hoje pago- um custo de feridas não cicatrizadas. Mas foi nossa decisão que, desdobrada nos planos Bresser e Verão, veio até o Real. Este já estava idealizado pelo ministro do Planejamento do meu governo, João Sayad. Mas eu não tinha condições políticas de fazê-lo.
O presidente FHC contou que quando reuniu os economistas para construir um novo plano, eles disseram: "Já está pronto, é só implantá-lo".
Assim, o Cruzado é a maior aprendizagem no caminho da estabilidade econômica. Baixou o desemprego a uma média de 3,59% -a menor até hoje-, o crescimento econômico foi de 99% do PIB per capita e de 119% do PIB total, e a inflação dolarizada, de 17,3%.
A inflação de 80% de março de 1990 não era minha, mas das expectativas do futuro governo. Outra consequência política foi que o pleno emprego criado pelo plano deu força aos trabalhadores, e não é sem motivo que já em 1989 quase fizeram o presidente.
No futuro, quando se escrever a história desses anos, o Plano Cruzado receberá justiça como uma heroica decisão que mudou o modo de enfrentar crises e o Brasil.

JOSÉ SARNEY escreve às sextas-feiras nesta coluna.
jose-sarney@uol.com.br


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