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OTAVIO FRIAS FILHO
Juízo final
Não é novidade que política e economia estejam entrelaçadas como nunca nesta campanha eleitoral. O
dado novo é a aceleração espantosa
com que o ambiente econômico passou a se deteriorar. A persistir esse ritmo, o desfecho das eleições -e do
próprio governo Fernando Henrique- torna-se ainda mais imprevisível do que já era nesta campanha repleta de surpresas.
Embora seu crescimento nas pesquisas tenha sido, aparentemente, estancado, Ciro Gomes reuniu uma ampla frente alternativa, cavando uma
via entre o governismo e a oposição
tradicional. Sua candidatura cavalga a
crise econômica, cuja piora alimenta o
descontentamento que a está encorpando. Jogo delicado em meio a uma
situação explosiva.
O candidato do governo, José Serra,
afora as dificuldades já conhecidas, está numa sinuca. No momento em que
sua campanha decidia "colar" na imagem do atual presidente, de olho em
sua resistente popularidade, esta começa a despencar. O ex-ministro precisa diferenciar-se do governo e identificar-se com ele, o que é obviamente
um dilema paralisante.
Pelo lado das duas candidaturas de
oposição, o que prevalece no momento é o esforço para mostrar-se "confiável", pois a percepção de que uma catástrofe ronda o país vai chegando, enfim, à maioria do eleitorado. Tal esforço cobra seu ônus, sobretudo, do candidato Lula, que se vê obrigado a mudar de discurso com rapidez que soa
pouco convincente.
A palavra de ordem, para ele e para
Ciro, parece ser: nem tanta oposição
que açule o medo dos mercados e a insegurança natural do eleitor, nem tanta "confiabilidade" que os aproxime
demais da atual estrutura de poder,
sobretudo se ela vier a ser tragada
num eventual cataclismo em algum
momento dos próximos e decisivos
meses, se tanto.
Desse ângulo, parece haver dois cenários mais verossímeis. Num deles, o
governo obtém nova ajuda do FMI e
acalma os mercados, o que lhe permitiria ao menos adiar o temido juízo final. No outro cenário, menos provável, a deterioração escaparia do controle das autoridades e a imprevisibilidade eleitoral chegaria ao máximo.
Na primeira hipótese, predominaria
a orientação mais "centrista" e "confiável" que tem sido o rumo discursivo
dos candidatos Lula e Ciro. Na segunda, poderá assumir o primeiro plano a
preocupação de não se deixar contaminar pelo naufrágio do modelo que,
a bem da verdade, ambos os candidatos vêm criticando há muitos anos.
A analogia entre Fernando Henrique e Alfonsín, que teve de abreviar
seu final de mandato, ou com Menem,
de memória mais recente, parecem
ainda implausíveis. Uma débâcle da
economia brasileira teria consequências externas muito mais nefastas do
que as do vizinho do sul, e o governo
atual ainda não esgotou suas possibilidades de defesa.
Serra ainda poderá subir nas pesquisas; é difícil, mas não impossível. Nesse caso, haveria embolamento no primeiro turno numa disputa pelas duas
vagas no segundo. Se isso não acontecer, o establishment deverá se dividir
entre Lula, que ao menos tem estrutura partidária, e Ciro, o voluntarista
que juntou ACM, Brizola e Tasso na
mesma arca de Noé.
Otavio Frias Filho escreve às quintas-feiras nesta coluna.
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