São Paulo, sexta-feira, 01 de setembro de 2006

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JOSÉ SARNEY

A grande ausente

NO BRASIL, nunca a política externa fez parte da política interna. As relações internacionais estão, na maioria das vezes, ao nível de relações diplomáticas bilaterais e, quando muito, de uma quermesse de reuniões em que predominam os comunicados finais. O mundo vive um instante contraditório. É o mais longo período de crescimento da economia, da revolução da informática e, por outro lado, de uma liderança unipolar, onde os Estados Unidos exercem uma liderança incontrastável e incontestável. Desenham-se vários cenários futuros em que se pergunta se essa liderança se consolida numa estratégia de gigantesco crescimento econômico, se perde substância -dividindo o poder com a China e a Europa unificada, incluindo a Rússia- ou se teremos uma outra solução traumática para que surja uma ordem mundial multipolar. A China e a Índia, com um crescimento em níveis altos, constituirão economias de primeira linha, com algumas profecias de que até o ano 2015 poderão igualar-se aos Estados Unidos. A América Latina vive um momento de contorção, com alguns sinais de recuo no processo da integração. O México e a América Central desgarram-se para -pelo Nafta (o tratado de livre-comércio)- terem economias satelizadas com os EUA. Resta a América do Sul, com problemas sérios de inserção na globalização. E aí vem o Brasil, com a difícil tarefa de consolidar sua liderança sul-americana. Para isso precisa crescer, melhorar suas condições internas de segurança e justiça social, enfim, preparar-se para ser um interlocutor com influência nas decisões mundiais. O processo de integração, concebido através do Mercosul, está em fase de estagnação e com uma tendência a politizar-se, o que é um mal irreparável. Quando nós o concebemos, a única cláusula política era de que os integrantes fossem países democráticos. Outro fator mais que importante para a América do Sul é a característica de ser um subcontinente pacífico, livre de corridas armamentistas e de armas nucleares. Durante meu governo, por proposta nossa, foi declarada pela ONU a Zona de Paz do Atlântico Sul. Agora, com o desejo da Venezuela de tornar-se potência militar, esse equilíbrio pode romper-se. E o Brasil não pode deixar suas Forças Armadas em situação de inferioridade, sob pena de alienarmos a soberania nacional. Sob esse quadro, até hoje, no meio da campanha presidencial, ninguém tratou de política externa. Como o Brasil deve inserir-se no contexto internacional. E que estratégia adotará? Esse tema é o grande ausente da campanha eleitoral.



jose-sarney@uol.com.br

JOSÉ SARNEY
escreve às sextas-feiras nesta coluna.


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