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ANTONIO DELFIM NETTO
Comércio e colonialismo
Na discussão sobre o papel
da China na evolução da economia, não há o que duvidar
das vantagens da complementaridade sinergética entre o
Brasil (fornecedor importante de alimentos e de recursos naturais) e a China (maior exportador de produtos industriais).
O que se pode discutir é a
qualidade da nossa política
econômica e a ingenuidade de
continuar a considerar a taxa
de câmbio (nominal e real) como era quando não havia liberdade de movimento de capitais: o preço que equilibrava os fluxos do valor das exportações e importações de bens e serviços.
A taxa de câmbio é o preço
de um ativo financeiro que está no portfólio de milhares de
agentes que produzam oportunidades de arbitragem (na
terceira casa decimal) em operações de milissegundos que
dependem, fundamentalmente, de crenças, fatos e boatos...
O que é preciso vigiar é a política do Politburo asiático pela qual o Estado Soberano Chinês deve procurar estabelecer
a garantia de suprimento comprando recursos naturais em
Estados soberanos.
O enorme e merecido sucesso da administração chinesa
depois de Mao deve-se ao seu
enorme pragmatismo. Aproveitou-se magistralmente da
aproximação estratégica dos
EUA (para isolar a URSS) e da
abertura do seu mercado para
os produtos de empresas americanas instaladas na China.
Gerou, assim, um crescimento da ordem de 11% ao ano, que a transformou na segunda economia.
Graças a uma política industrial inteligente, apropriou-se e tenta aperfeiçoar a
tecnologia importada. Por
que, então, o neocolonialismo? Porque o Politburo sabe
que, devido à escassez interna
de recursos (água, terra, alimentos, minérios, energia), é
muito pouco provável que
possa repetir 30 anos crescendo a 9% ao ano, como é seu
projeto.
O problema é aritmético. O
mundo tem crescido nos últimos 200 anos a uma taxa de
2% a 3% ao ano. Se nos próximos 30 anos a China crescer
9% ao ano, e o mundo insistir
em crescer 3%, um cálculo elementar mostra que a sua participação no PIB mundial saltará de 12% para 70% em 2040!
Em outras palavras, a China, que hoje, com 20% da população mundial, produz 12%
do PIB mundial, em 2040, com
17% da população, produziria
70% do PIB mundial. Para
acomodar tal crescimento, o
"resto do mundo" deveria reduzir a sua participação no
PIB em 0,4% ao ano, o que é politicamente inadmissível.
Se o "resto do mundo" crescer a 3%, e a China a 9%, seria
preciso que o PIB mundial
crescesse a 4,5%, o que não
parece factível, pela falta de
recursos e pelo aquecimento global.
É duvidoso, então, contar com mais um trintênio de crescimento da China a 9% ao ano.
ANTONIO DELFIM NETTO escreve às
quartas-feiras nesta coluna.
contatodelfimnetto@uol.com.br
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