São Paulo, segunda-feira, 01 de outubro de 2007

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RUY CASTRO

Espírito de porco

RIO DE JANEIRO - Nas discussões sobre "Tropa de Elite", o bangue-bangue entre polícia e traficantes, há quem acuse o filme de ser a favor demais da polícia -donde "fascista". Outros o acham apenas realista ou coisa que o valha. Não me pergunte, não fui assisti-lo e não tenho opinião. Mas há um ponto nesses debates em que, inspirados pelo filme, todos os litigantes parecem concordar e ninguém sequer discute: é preciso liberar as drogas. Sem o tráfico, acaba o traficante -garantem a uma voz.
Será? Parece boa idéia, mas, perguntará um espírito-de-porco: que drogas seriam liberadas? Se for apenas a maconha, não se pode garantir que o dito traficante tenha de se aposentar -porque sempre lhe sobrarão as outras drogas com as quais ele já trabalha: cocaína, crack, ácido, êxtase e demais substâncias de grande procura entre os jovens. Aliás, se a maconha for liberada, é certo que o grosso da demanda se voltará para essas atrações.
Supondo que haja uma liberação geral e que, com uma penada, todas as drogas fiquem dentro da lei, aí, sim, nossos traficantes se verão em palpos de aranha. Terão de mudar de ramo, talvez drasticamente. Alguns abandonarão suas bocas-de-fumo no Alemão e virão trabalhar com carrocinhas de pipoca na porta dos cinemas da zona Sul. Outros, egressos da Maré, talvez se dediquem a vender CDs piratas do padre Marcelo na Central do Brasil. E o que farão com seus tremendos arsenais? Sendo certo que abandonarão a vida de crimes, só lhes restará vender seus fuzis e granadas de volta para a PM ou para o Exército, quem sabe com prejuízo.
A idéia de que, legalizado um produto, o tráfico perde a razão de ser, é boa na teoria. Mas há uma pergunta que não quer calar: se quase todo o comércio é legalizado, por que não se consegue acabar com o camelô?

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