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RUY CASTRO
Espírito de porco
RIO DE JANEIRO - Nas discussões sobre "Tropa de Elite", o bangue-bangue entre polícia e traficantes, há quem acuse o filme de ser a
favor demais da polícia -donde
"fascista". Outros o acham apenas
realista ou coisa que o valha. Não
me pergunte, não fui assisti-lo e não
tenho opinião. Mas há um ponto
nesses debates em que, inspirados
pelo filme, todos os litigantes parecem concordar e ninguém sequer
discute: é preciso liberar as drogas.
Sem o tráfico, acaba o traficante
-garantem a uma voz.
Será? Parece boa idéia, mas, perguntará um espírito-de-porco: que
drogas seriam liberadas? Se for apenas a maconha, não se pode garantir que o dito traficante tenha de se
aposentar -porque sempre lhe sobrarão as outras drogas com as
quais ele já trabalha: cocaína, crack,
ácido, êxtase e demais substâncias
de grande procura entre os jovens.
Aliás, se a maconha for liberada, é
certo que o grosso da demanda se
voltará para essas atrações.
Supondo que haja uma liberação
geral e que, com uma penada, todas
as drogas fiquem dentro da lei, aí,
sim, nossos traficantes se verão em
palpos de aranha. Terão de mudar
de ramo, talvez drasticamente. Alguns abandonarão suas bocas-de-fumo no Alemão e virão trabalhar
com carrocinhas de pipoca na porta
dos cinemas da zona Sul. Outros,
egressos da Maré, talvez se dediquem a vender CDs piratas do padre Marcelo na Central do Brasil. E
o que farão com seus tremendos arsenais? Sendo certo que abandonarão a vida de crimes, só lhes restará
vender seus fuzis e granadas de volta para a PM ou para o Exército,
quem sabe com prejuízo.
A idéia de que, legalizado um produto, o tráfico perde a razão de ser,
é boa na teoria. Mas há uma pergunta que não quer calar: se quase
todo o comércio é legalizado, por
que não se consegue acabar com o
camelô?
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