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LUIZ FERNANDO VIANNA
A guerra das palavras
RIO DE JANEIRO - Ler e ouvir
diariamente, por dever de ofício,
dezenas de notícias policiais é desagradável não só pelas crianças feridas e pelo número absurdo de mortos -foram assassinadas no Estado
do Rio, entre janeiro e setembro
deste ano, 4.460 pessoas. Dói também a torpeza do estilo.
A banalização dos conflitos levou
a imprensa a aplicar frases feitas
que lhe são passadas pelas fontes da
polícia, as únicas disponíveis ou
procuradas. Sem minimizar as dificuldades das forças de segurança,
seguem algumas tentativas de tradução:
"Os policiais faziam um patrulhamento de rotina na favela X" - Não
há patrulhamento de rotina em favelas onde há traficantes armados.
Por segurança, só entram em grandes grupos. Ou então, para fazer negócio com os traficantes, como cobrar o arreglo -procedimento conhecido como "mineirar".
"Os policiais foram recebidos a tiros pelos traficantes" - Se estão entrando para combatê-los, não estranha que sejam recebidos assim. É a
infeliz lógica de guerra. Com frequência, como diz outra expressão
clichê, "entram atirando". Crianças
e idosos costumam ser surpreendidos nesses casos pelas chamadas
balas perdidas.
"X bandidos morreram na operação" - Pretos, pobres e mal vestidos
são, a priori, bandidos, mesmo que
não se saibam os nomes e se têm fichas policiais. Se familiares e moradores "fecham a avenida X para
protestar com paus e pedras contra
a polícia", desconfia-se que algum
inocente tenha morrido.
"Deu entrada no hospital X, mas
não resistiu aos ferimentos" - Foi
morto no confronto, mas não convém deixar o corpo para eventuais
perícias -ainda que improváveis-
ou queixas de parentes.
"Será aberta uma sindicância para apurar as responsabilidades dos
policiais" - Nada acontecerá.
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