São Paulo, sexta-feira, 02 de janeiro de 2004

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ELIANE CANTANHÊDE

Togas de molho

BRASÍLIA - Em 2004, deve se aprofundar o processo de avaliação e até de depuração da magistratura brasileira. O juiz, ser intocável, acima do bem e do mal, caiu do pedestal e está sob julgamento público. É bom para o país, para a instituição e, principalmente, para o próprio juiz "do bem".
No imaginário popular e em boa parte do Brasil, o juiz era (em alguns casos, ainda é) aquele cidadão sisudo, erudito, justo, cuja honra jamais seria colocada sob suspeita. Ele estava (está) nas solenidades, nos casamentos, nas festas públicas e privadas, ao lado do prefeito e do padre.
Na realidade e na atualidade, com cerca de 13 mil juízes no país, essa imagem já não é tão impermeável. Reportagem da Folha no último dia 22 mostra que pelo menos 14 magistrados estão sob acusação de irregularidades, em seis Estados. Sem contar os investigados pela Operação Anaconda, da Polícia Federal.
Em 2003, juízes de Norte a Sul se esgoelaram contra o controle externo do Judiciário, a reforma da Previdência, o teto salarial e a revisão da aposentadoria precoce, com vencimentos integrais. Na outra ponta, foi em 2003 que a Anaconda flagrou juízes negociando sentenças, almas e a imagem da instituição que representam. Votos para que, logo, logo, façam companhia ao juiz Nicolau dos Santos Neto, aquele do TRT-SP.
Ninguém questiona o valor da independência do juiz numa democracia, mas tudo tem limite. Quem mais deveria se indignar contra sentenças absurdas, liminares suspeitas e desvios evidentes deveria ser o próprio juiz. Em vez de mandar mensagem contra reforma da Previdência e controle externo, que tal escrever a favor da prisão do Lalau e de julgamentos duros para colegas corruptos?
Sr. juiz, você que pensa mais no país e na instituição do que em privilégios antiquados, seja bem-vindo a 2004 e ao indispensável debate sobre o Poder Judiciário. Que ele entre em 2005 melhor do que saiu de 2003. E em mais sintonia com o povo, que está louco para acreditar no seu prefeito, no seu padre e no seu juiz.



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