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LUCIANO MENDES DE ALMEIDA
Oração e partilha
Nas semanas que preparam a
Páscoa de Jesus, as comunidades
cristãs intensificam a prática da oração, do jejum e da esmola. São atitudes que manifestam e acompanham o
processo de conversão de nossas faltas
e de volta filial para Deus.
A oração faz-nos entrar em comunhão com o Pai do Céu, reavivando
em nós a confiança e o abandono de
Jesus, cujo anseio era fazer em tudo a
vontade de seu Pai. Esta é a característica mais bela de Jesus: a sua união
profunda e total com aquele que o
ama e o envia a este mundo para nos
salvar. Para Jesus, a oração não era
apenas um momento de sintonia com
o desígnio salvífico de seu Pai, era um
deixar-se possuir pelo seu amor paterno e nele encontrar a força, a paz e a
alegria interior. Jesus agradecia os
dons recebidos e atribuía ao Pai todo o
bem que fazia, numa vivência perfeita
de quem se sabe amado e retribui
doando-se com amor à sua missão.
O tempo da Quaresma convida-nos
a revermos a prática de nossa união
com Deus. Aqui está o cerne da atitude evangélica de conversão. Não se
trata somente de, com a graça divina,
afastar-se do pecado. É mais. Muito
mais. Somos chamados a descobrir no
íntimo de nosso ser o apelo a uma vida
de intensa comunhão com Deus, que
nos acompanha ao longo do dia. É
uma presença constante que nos sustenta, anima e dá sentido à vida, superando toda solidão e abrindo perspectivas novas de diálogo amoroso com
Deus.
Às vezes, o ritmo do trabalho e as
preocupações parecem ocupar toda a
atenção interior e nos fazer esquecer
-por um momento- a experiência
da união e da confiança em Deus. É
necessário, porém, desapegar o coração do que poderia distrair-nos e, como quem procura a água, o ar, a brisa,
a Lua, voltar-se logo para Deus e perceber de novo a sua insubstituível presença, a única que nos dá paz, segurança e a alegria de saber-se amado.
Jesus passa pela experiência do deserto para nos ensinar a fazer a descoberta de que só o encontro com o Pai sacia e plenifica o coração humano.
Como atingir o discernimento a respeito da precariedade dos bens terrenos, libertando-nos do caleidoscópio
das imagens e da agitação interna? O
exercício do jejum nos ajuda a alcançar o desprendimento de atrações ilusórias e o controle de nós mesmos,
evitando tudo o que prejudica a liberdade interior de nós mesmos. Temos
de nos reeducar no uso do alimento,
da bebida e, muito mais, na atenção
interior de quem aprendeu a vencer a
inclinação ao ódio, à cobiça e à busca
desordenada do prazer e do poder.
Aqui se insere na tradição cristã a
beleza da esmola, da doação gratuita,
da partilha com os irmãos. Trata-se de
um ato generoso de quem abre mão
de seus benefícios e privilégios para
aliviar o sofrimento dos pobres. Ajuda
muito entender a esmola não como
um pequeno gesto de desapego do supérfluo e do que não nos faz falta. É
preciso compreender a esmola à luz
da infinita misericórdia divina, como
uma atitude magnânima de amor fraterno de quem dá o melhor de si aos
irmãos necessitados.
Essa experiência de sincera doação
ao próximo causa uma alegria maravilhosa no coração humano. Quem
não se sente feliz ao enxugar as lágrimas de uma criança e ao socorrer uma
família sofrida? Uma das razões da
tristeza que tantas vezes nos aflige é a
falta de generosidade em dar e em partilhar. Assim, o processo de conversão
evangélica vem oferecer-nos a surpreendente novidade do convívio
amoroso com Deus pela oração e a vivência da gratuidade da partilha fraterna. São sinais que já nesta vida
anunciam a felicidade que a Ressurreição de Jesus conquistou para nós.
D. Luciano Mendes de Almeida escreve aos sábados nesta coluna.
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