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TENDÊNCIAS/DEBATES
Eqüidade beneficia Paraguai e Brasil
FERNANDO LUGO
Dizem com freqüência que o projeto político que lidero no Paraguai é "antibrasileiro". Nada poderia estar mais distante da verdade
COM FREQÜÊNCIA procura-se
retratar o projeto político que
lidero no Paraguai como sendo
"antibrasileiro". Nada poderia estar
mais distante da verdade. Todos os
que integramos a Aliança Patriótica
para a Mudança (APC, na sigla em espanhol) temos profundo respeito pelo povo, pelas instituições e pelo governo brasileiros. Nosso objetivo é
avançar em direção a uma cooperação maior sobre bases justas.
Os povos do Paraguai e do Brasil
herdamos problemas cujas raízes estão nas ditaduras militares. Estamos
certos de que devemos enfrentar esses problemas e encontrar soluções
para eles.
Durante a ditadura de Alfredo
Stroessner, foram gerados negócios
de fronteira, em muitos casos ilícitos.
Hoje, muitos paraguaios e brasileiros
vivem dessa atividade. Precisamos
acabar com a doença, mas sem matar
o doente (os postos de trabalho) -pelo contrário, curando-o (com mais
empregos dignos). Precisamos avançar juntos num processo de legalização e intensificação da produção em
toda a região da fronteira.
Foi também na época das ditaduras
que ocorreu uma forte migração de
colonos brasileiros a território paraguaio virgem. Hoje, o meio ambiente
está devastado, e a população camponesa paraguaia se vê encurralada pelos grandes produtores de soja (que
não são apenas "brasiguaios", mas
também paraguaios ou de outras nacionalidades), que empregam agrotóxicos com pouco controle.
A maioria dos antigos colonos brasileiros hoje já tem filhos paraguaios e
respeita as leis. Os que assim procedem não terão dificuldade com nosso
governo. Em contrapartida, aqueles
-seja qual for sua nacionalidade-
que não obedecem às leis deverão começar a fazê-lo.
Nunca, por convicção própria, vamos discriminar ninguém por sua nacionalidade, raça, religião ou simpatia
política. Esse é um compromisso de
todos os integrantes da APC, avalizado por nossa trajetória de luta pelos
direitos humanos.
Estamos convencidos de que -sob
condições de eqüidade- Itaipu será o
principal instrumento de integração
dos povos paraguaio e brasileiro.
Alguns afirmam que, mesmo quando for muito injusto com o povo paraguaio, o tratado de Itaipu deve continuar em vigor até 2023 tal como foi
firmado em 1973, sob as ditaduras militares do Brasil e do Paraguai.
Não existe fundamento para a manutenção dessa atitude. Queremos
dialogar com o governo de Luiz Inácio Lula da Silva partindo da própria
base do tratado de Itaipu: a ata de Foz
do Iguaçu (1966), firmada e ratificada
pelo Brasil. Ela está em vigor e assinala que o Paraguai deve receber um
"preço justo" pela energia que exporta ao Brasil. Queremos dialogar sobre
esse ponto aceito pelas duas partes.
Quando foi assinado o tratado de
Itaipu (em 26 de abril de 1973), o petróleo custava pouco mais de US$ 2
por barril. Hoje, seu preço está em
torno de US$ 100 por barril.
O Paraguai recebe hoje por sua
energia muito menos, em termos
reais, que em 1973. Hoje podemos
comprar muito menos petróleo que
há 35 anos. E consta que, naquele ano,
toda a opinião pública paraguaia viu
como irrisórios os benefícios fixados
no tratado. Não pretendemos cobrar
o que não nos pertence. Aspiramos só
a um "preço justo", como o Brasil
concordou em nos pagar em 1966.
Chegar a um acordo justo em Itaipu
vai possibilitar o melhor desenvolvimento dos dois países. Quando não
existe um "preço justo" entre um país
mais poderoso e outro mais fraco,
predomina o conflito, mais que a cooperação. As duas nações saem perdendo. Por isso, quando propomos
chegar a um "preço justo", estamos
contribuindo para o desenvolvimento melhor de ambas as partes.
Assim se entendeu na Europa
quando foram mantidas as assimetrias entre as nações e regiões menos
desenvolvidas e as mais desenvolvidas. Assim entendemos nós, que desejamos um Paraguai soberano e integrado ao Mercosul, fortalecendo
vínculos com o Brasil e seu povo sobre bases justas.
Nas eleições de 20 de abril, existem
duas opções: o desenvolvimento harmônico dos dois países ou o desenvolvimento excludente do Brasil e a ruína do Paraguai, caso em que nosso
país será mais uma vez pólo de tensões e problemas na região.
Não temos dúvida de que a primeira é a opção correta. Como dizemos
em nossa língua indígena, "oñondive
mante jajapóta" ("só juntos é que vamos poder fazer"). Nesse "juntos" incluímos não apenas o Paraguai, mas
também o Brasil.
FERNANDO LUGO MÉNDEZ, 56, licenciado em ciências
religiosas, ex-bispo da Diocese de San Pedro (1994-2005),
é candidato à presidência do Paraguai pela APC (Aliança
Patriótica para a Mudança, na sigla em espanhol).
Tradução de Clara Allain.
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
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