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Alguma coisa acontece nas mentes tucanas
JOSÉ AUGUSTO GUILHON ALBUQUERQUE
O tucanato dá novo passo em trajetória descendente: de um partido de quadros a uma legenda dilacerada pelo caciquismo regionalista
INDEPENDENTEMENTE do que
possamos almejar para a Prefeitura de São Paulo nas próximas eleições, a sorte já está lançada: algumas
opções se tornaram improváveis, certas coisas já não vão ocorrer e assim,
eliminando-se o que se tornou impossível, sobra apenas o que é inevitável.
O quadro que prevaleceu em São
Paulo até a eleição de Marta Suplicy
-um embate entre a direita e a esquerda, com os moderados imprensados no centro- tornou-se extremamente improvável. Um dos pólos será
um candidato "natural" de situação.
O outro terá que ocupar o espaço da
oposição, um espaço também "natural", mas com as cores da revanche.
O PT e o governo Lula não podem
ceder a candidatura de oposição em
São Paulo a um aliado qualquer nem
escalar um petista sem voto como foram, no passado, Plinio Sampaio, José
Dirceu ou José Genoino. Está em jogo
a continuidade de seu projeto de poder a partir de 2010.
Se a oposição nacional não for derrotada em São Paulo e a ascensão de
Serra como candidato presidencial
não for revertida ou seriamente comprometida, a probabilidade de obter
um terceiro mandato para Lula torna-se insignificante e as chances de
eleição de um "poste" graças à magia
presidencial caem pela metade.
Não nos iludamos, Lula virá com
tudo, e Marta, com a naturalidade
da candidatura caindo-lhe ao colo,
não poderá escapar ao "sacrifício",
sobretudo depois que tantas cabeças
de barões petistas rolaram com o
mensalão.
Com Lula empenhando seu futuro
político -um futuro, como diria
Montesquieu, que põe em jogo "sua
vida, seus bens e sua honra"- e com
Marta em campanha, não haverá escolha em matéria de alvo. Se o PT não
concentrar suas baterias na gestão
Serra/Kassab, o candidato de situação terá um avenidaço para desfilar
uma campanha positiva e propositiva.
E com ampla probabilidade de vitória.
Poderá haver algum Chico Rossi e
uns tantos nanicos, mas, para eles, como para Maluf, o espaço tornou-se rarefeito diante de um quadro acirrado
de luta pela sobrevivência.
O grande complicador é o pólo que
goza da situação mais confortável. A
gestão Serra/Kassab conta com boa
avaliação e dispõe de uma plataforma
de lançamento como nunca os tucanos tiveram: o controle político-eleitoral da capital e do Estado.
Isso permitiria aos situacionistas
enfrentar as eleições municipais e,
mais tarde, estaduais e presidenciais
em patamar significativamente mais
confortável do que os de 94, 98, 2002,
2004 e 2006. Isso não é pouco dizer.
Qual é a complicação? Trata-se de
uma controvérsia, aparentemente
doutrinária, entre "candidatura própria" e "manutenção da aliança". Uma
controvérsia que vale apenas para tucanos abaixo do Trópico de Capricórnio, uma vez que não vale em Minas,
nem na Bahia, nem em Pernambuco,
nem muito menos no Ceará.
Os partidários da "candidatura própria" querem que o atual prefeito não
se apresente à própria reeleição para
abrir caminho à candidatura Alckmin. Isso, naturalmente, não vai
acontecer. E os partidários da "manutenção da aliança" querem que os cardeais tucanos neguem a legenda a Geraldo Alckmin para abrir caminho para a candidatura Kassab. Isso também
não vai acontecer.
De um lado, Gilberto Kassab não
pode moralmente se furtar ao julgamento popular e, com boa avaliação e
popularidade em alta, não tem razão
para fazê-lo. Geraldo Alckmin, por
sua vez, irá até o fim. Sabendo que não
pode remover a candidatura do atual
prefeito, como sabe também que o veto de um cardeal tucano à sua própria
candidatura não vai acontecer, verá
praticamente reduzidas a zero suas
chances de recuar engrandecido pelo
papel de vítima.
Assim sendo, uma vez que o candidato de situação será... o próprio prefeito, Alckmin será o candidato próprio. Mas poderá ser um candidato
apropriado? Se sua mensagem for de
continuidade, encontrará um espaço
já ocupado e, se for de ruptura, não terá como disputar a primazia do PT.
Se Gilberto Kassab não traiu e sua
gestão não é incompetente nem corrupta, por que diabos os tucanos haverão de romper com seu próprio governo? Pelo prazer de entrar em bola
dividida?
O resultado é que o PSDB leva, mais
uma vez, uma liderança promissora a
buscar seu próprio sacrifício, e o tucanato dá mais um passo em sua trajetória descendente: de um partido de
quadros a uma legenda dilacerada pelo caciquismo regionalista.
JOSÉ AUGUSTO GUILHON ALBUQUERQUE, 67, é professor titular aposentado da FEA-USP (Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade). É autor, entre outras obras, de "O Legado de Franco Montoro".
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