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FERNANDO RODRIGUES
A cultura do privilégio
BRASÍLIA - Um funcionário público organizava um evento há algumas semanas e encafifou com o fato
de haver apenas copos de plástico
para servir água às autoridades.
Queria comprar copos de vidro. Alguém então teve a coragem de perguntar: "Qual é o problema de beberem água em copos de plástico?".
Economizou-se dinheiro.
Esse episódio prosaico ilustra a
cultura vigente no poder público
nacional. Chefes de repartição exigem tratamento especial. Copos de
plástico? Nem pensar. Para ministro, juiz ou congressista, a deferência requerida vai ao paroxismo. Há
exceções, mas a regra dessa turma é
sentir asco por ficar numa fila ou
carregar a própria mala.
Essa ausência de valores republicanos está no DNA da atual onda de
escândalos. Basta ver a sem cerimônia das respostas dos protagonistas.
Para eles, tudo é legal.
No Executivo, o ministro Hélio
Costa (Comunicações) usa motorista e secretária pagos pelo Senado. Acha o despautério natural.
No Congresso, metade dos deputados viajou ao exterior usando
passagens aéreas destinadas ao
exercício do mandato. O presidente
da Câmara, Michel Temer, declarou considerar tudo "lícito".
Pelo menos dois ministros de altas cortes de Justiça tiveram integrantes de suas famílias recebendo
tratamento especial quando em
viagens ao exterior. Os benefícios
oficialmente solicitados incluíam
furar as filas de embarque e dispensa de abrir as malas na alfândega. O
presidente do STF, Gilmar Mendes,
aquiesceu: "O auxílio se presta nos
aeroportos sem nenhuma conotação de privilégio".
Com seu poder de síntese, Lula
resumiu o jeito macunaímico de fazer política no país: "Eu não sei o
que vocês veem de novidade no que
acontece na Câmara (...). Que um
deputado utiliza passagem? Isso é
utilizado desde que o Congresso é
Congresso, gente". Em resumo, a
cultura do privilégio está aí para ficar. Não há risco de melhorar.
frodriguesbsb@uol.com.br
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