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KENNETH MAXWELL
Defesa e democracia
QUANDO VISITEI pela primeira vez a Espanha, em
1963, a imagem de Francisco Franco enfeitava os selos do
país, com o título "Caudillo de España". Ele era também o "generalíssimo" das forças armadas espanholas.
Os postos eram ocupados,
segundo Franco, "pela graça de
Deus". Após sua morte, em 1975,
desemaranhar o legado deixado
por ele, que tinha bem menos a ver
com a graça de Deus do que com o
fato bruto de sua vitória na Guerra
Civil Espanhola, não foi fácil.
Ao longo da maior parte da era
Franco, de fato, o Exército espanhol havia funcionando quase como uma força de ocupação, em
guarnições espalhadas pelo país
mais em virtude da segurança interna do que da defesa contra
ameaças externas. Com estruturas
de comando inalteradas ao longo
de mais de 30 anos, o Exército sofria de um excesso de generais envelhecidos e, porque os custos de
pessoal absorviam a maior parte do
orçamento, a mobilidade das tropas era baixa e elas dispunham de
pouco equipamento moderno.
Os velhos oficiais do Exército
franquista se queixaram da legalização do Partido Comunista, em
1977, e ainda mais do reconhecimento da Espanha como Estado
multinacional, na Constituição espanhola de 1978, que transferiu poderes substanciais aos governos regionais, mais significativamente o
da Catalunha. Esse descontentamento culminou em uma tentativa
de golpe de Estado, em fevereiro de
1981, quando unidades paramilitares da Guarda Civil e oficiais do
Exército tomaram o Parlamento e
transformaram em reféns os membros do governo. A intervenção decisiva do rei Juan Carlos conteve o
estrago. Mas os líderes civis compreenderam que não era mais possível adiar a imposição firme e efetiva de controle civil sobre as Forças Armadas.
O Ministério da Defesa espanhol
foi criado em 1977, mas suas funções eram apenas decorativas. Foi
o governo socialista eleito em 1982
que impôs na prática o comando civil, atribuindo ao primeiro-ministro responsabilidade direta pelo
comando e coordenação das Forças Armadas. O Estado-Maior conjunto se tornou órgão consultivo e
não de comando, e surgiu o posto
de chefe do Estado-Maior geral,
com responsabilidade pela ação
conjunta entre Marinha, Exército
e Aeronáutica. O ministro da Defesa ficou com a responsabilidade
pela determinação das políticas
militares e, assim, estabelecer
prioridades e modernizar radicalmente as estruturas militares. Os
gastos com defesa subiram de maneira acentuada, no início do processo, mas a reforma funcionou.
A história de sucesso construído
pela Espanha deveria ser estudada
com atenção em Brasília, depois do
desastre de Congonhas.
KENNETH MAXWELL escreve às quintas-feiras nesta coluna.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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