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São Paulo, quinta-feira, 02 de outubro de 2003

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TENDÊNCIAS/DEBATES

As empresas e o "Analfabetismo Zero"

ODED GRAJEW

Você, que está lendo este artigo, imagine-se realizando as tarefas mais simples do seu dia-a-dia sem ler nem escrever uma única palavra. Feche os olhos e pense como seria se locomover e procurar o endereço do seu destino, não saber o que está escrito nos seus documentos de identidade, não poder ler o que está escrito nas embalagens dos produtos, nas contas, nas bulas dos remédios, nos jornais, nos livros. Não poder escrever ou ler cartas e não poder assinar seu nome em documentos.
Essa, infelizmente, é a triste realidade de pelo menos 20 milhões de brasileiros com mais de 15 anos de idade. É uma vergonha para um país que está entre as maiores economias do mundo e que consegue ter indústrias de alta tecnologia. Essa é mais uma prova de que nosso país é sobretudo um país injusto.
Dentro do Programa Fome Zero, o Ministério da Educação, por intermédio da Secretaria Extraordinária de Erradicação do Analfabetismo, está coordenando o maior esforço já realizado para a eliminação do analfabetismo. A participação da sociedade nesse desafio é fundamental, e as empresas podem e devem colaborar de diversas maneiras possíveis. Veja algumas sugestões que foram elaboradas pelo MEC:
A primeira contribuição da empresa é garantir que todos os funcionários e seus familiares sejam alfabetizados. Isso pode ser feito em parceria com uma instituição alfabetizadora ou por meio da manutenção de salas de aula em suas dependências. As aulas podem ser ministradas por professores contratados ou por funcionários que tenham graduação ou ensino médio, desde que eles recebam formação adequada.
Com duas horas de aula por dia, em pouco tempo o funcionário analfabeto se tornará um cidadão alfabetizado capaz de ler, escrever e realizar as operações básicas de matemática. E esse mesmo benefício poderá ser estendido aos familiares dos trabalhadores.


A primeira contribuição da empresa é garantir que todos os funcionários e seus familiares sejam alfabetizado
Uma empresa alfabetizada pode contribuir para erradicar o analfabetismo no bairro ou na comunidade onde está inserida. Em parceria com uma instituição alfabetizadora, a empresa poderá financiar cursos de alfabetização à disposição da população. Outra opção é apoiar instituições alfabetizadoras com doações em dinheiro, ajudando na manutenção de salas de aula ou por meio de doações de material escolar, mobiliário, transporte, merenda, óculos etc.
As empresas podem também fazer parcerias com prefeituras e governos estaduais para financiar programas governamentais de alfabetização.
Mas há outras formas de contribuir. Por exemplo, as empresas podem ajudar o poder público a contar e localizar os analfabetos em cada município, seja destacando funcionários para a pesquisa de campo, seja doando computadores ou participando da formulação de pesquisas. Saber quem são e onde estão os analfabetos é fundamental para que nenhum brasileiro perca a oportunidade de aprender a ler e escrever.
As empresas, em parceria com a comunidade, podem se aliar ao governo, criando mecanismos locais de acompanhamento dos programas de alfabetização (o MEC disponibiliza informações sobre as instituições alfabetizadoras nos municípios).
Toda empresa tem uma área de influência, que vai de funcionários, clientes e fornecedores até instituições como sindicatos e associações. Atuar junto a esse público, a favor da abolição do analfabetismo, é mais uma maneira de contribuir, funcionando como um pólo de mobilização, atraindo novos parceiros para o Programa Brasil Alfabetizado. Um "placar da alfabetização" permitirá à sociedade acompanhar dia a dia o número de pessoas alfabetizadas em todo o país e servirá para orientar as ações do governo e instituições alfabetizadoras, até que o Brasil esteja livre do analfabetismo.
O placar da alfabetização destacará as instituições governamentais e não-governamentais que estiverem ajudando a abolir o analfabetismo. As informações serão divulgadas em diversos pontos do país e ficarão disponíveis on-line para consulta da sociedade, além de estarem interligadas a gabinetes de diversas autoridades, entre elas o ministro da Educação e o presidente da República.
A inserção social dos 20 milhões de brasileiros que ainda não sabem ler e escrever vai ajudar a construir um país justo e mais humano e vai colaborar com o nosso crescimento econômico (o Ipea estima que o fim do analfabetismo pode elevar o PIB em 5%).
Estima-se que existam no Brasil aproximadamente 4 milhões de empresas. Se a metade delas se comprometesse a alfabetizar quatro brasileiros por ano, em dois anos e meio teríamos zerado o analfabetismo em nosso país! Esse é apenas mais um exemplo das possibilidades que temos no Brasil, através da solidariedade, de zerar a fome de comida, educação, saúde, trabalho, cultura; enfim, de todos os direitos humanos. O setor empresarial, tão poderoso e detentor de tantos recursos, tem um papel fundamental nessa empreitada.

Oded Grajew, 59, empresário, idealizador do Fórum Social Mundial e presidente licenciado do Instituto Ethos, é assessor especial do presidente da República.


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