São Paulo, terça-feira, 02 de outubro de 2007

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Ladeira abaixo

Juros baixos do Fed e economia fraca dos EUA lançam nova avalanche de dólares em busca de rendimento alto no Brasil

PARA ALGUNS observadores da economia contemporânea, a solução de uma crise global tem significado a semeadura da crise seguinte. O Fed baixou os juros diante da derrocada das ações de tecnologia em 2000, mas incentivou a especulação com imóveis que, sete anos depois, propicia tumulto. Ao repetir a dose agora, a fim de remediar o estrago financeiro causado pela recessão imobiliária, o BC dos EUA estaria ajudando a inflar a próxima bolha.
O futuro dirá se (e como) esse misto de teoria e fatalismo -afinal, a economia capitalista é cíclica por natureza- vai se confirmar mais uma vez. Menos controverso é que uma das correias de transmissão entre o remédio ministrado pelo Fed para lidar com sua crise local e o conjunto da economia mundial será o enfraquecimento do dólar.
A perspectiva de menor crescimento e juros cadentes nos EUA revigorou a busca por aplicações de maior rendimento. Nesse movimento, investidores vendem ativos denominados em dólar e compram papéis em outras moedas. Como resultado, o dólar se desvaloriza em relação às moedas de países que adotam o câmbio flutuante -concentrados na Europa e na América Latina. Os países asiáticos, contudo, persistem limitando drasticamente a flutuação de suas moedas com pesadas intervenções no câmbio.
A estratégia adotada pelas nações da Ásia, com a China e o Japão à frente, é a de assegurar taxas de câmbio relativamente desvalorizadas, favoráveis a suas exportações, e acumular grandes volumes de reservas internacionais. Ao manter o dinamismo de suas economias, impulsionam as exportações dos países produtores de commodities agrícolas, metálicas e energéticas.
Por sua vez, a desvalorização do dólar beneficia as exportações dos EUA para os países que não evitam a valorização de suas moedas. O movimento pode ajudar a compensar a retração econômica propiciada pela recessão no mercado imobiliário americano -aumentando a demanda por produtos "made in USA"-, mas pode, também, inibir a expansão da atividade na Europa. Uma desvalorização abrupta seria preocupante. Exigiria, provavelmente, um corte nas taxas de juros européias para freá-la.
No Brasil, a pressão pela valorização do real já foi revigorada. Ontem a cotação do dólar (US$ 1,81) bateu um novo recorde de baixa. Em setembro, o dólar caiu 6,6%. Por um lado, os preços elevados das commodities -catapultados pelo dínamo asiático- mantêm elevado o superávit comercial brasileiro. Por outro, a busca por rendimentos mais polpudos amplia a entrada de capitais no Brasil -"expulsos" pelos juros cadentes do Fed.
Somadas, a tendência de redução dos juros americanos e a de estagnação da Selic (implícita na última ata do Copom) propiciarão uma avalanche ainda maior de dólares em busca de papéis brasileiros. E isso sem contar com a possibilidade, concreta, de o mercado financeiro do Brasil tornar-se, mais cedo do que se prevê, oficialmente aberto para aplicações dos portentosos fundos de pensão americanos.


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