São Paulo, terça-feira, 02 de dezembro de 2008

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MARCOS NOBRE

Padrão Osesp

HÁ ALGUM tempo começou a circular a expressão "padrão Osesp". Refere-se à muito boa qualidade da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo.
A Osesp representa a visão de que o fomento à cultura deve ser o do investimento concentrado em poucos e ambiciosos projetos. A idéia é a de estabelecer um padrão de excelência que forme o público e sirva de referência de qualidade para outros projetos na mesma área.
É uma resposta tradicional ao dilema brasileiro de formar um público de cultura que já deveria ter sido formado. Se houvesse escola e padrões de vida minimamente decentes para toda a população.
Essa visão se estende agora também para a São Paulo Companhia de Dança, criada no início deste ano. Tal como a Osesp, a Companhia terá sede própria, um edifício orçado em R$ 300 milhões e projetado pelo escritório de arquitetura suíço que concebeu o estádio mais famoso da Olimpíada de Pequim, o chamado Ninho de Pássaro.
Tem tudo para seguir o exemplo da Osesp. O mais recente espetáculo mostra uma companhia ainda verde, mas com grande potencial e muito profissionalismo.
Talvez porque ainda nos seus inícios, a programação revela de maneira mais clara a concepção tradicional de cultura que a anima.
Não apenas executou obras clássicas de Stravinsky e de Tchaikovsky mas reconstituiu as coreografias e figurinos originais de 1923 e de 1935.
Uma das ilusões mais comuns na vida é a de pensar que é possível reconstituir uma experiência histórica "como realmente foi". Ao contrário, a única chance de uma obra continuar a ter vida é a de ser interpretada, de ser apropriada pela experiência do presente. Os dois monumentos clássicos da dança foram executados sem qualquer distanciamento, irônico ou trágico.
A obra contemporânea do programa foi um breve interlúdio, espremido entre as coreografias de Bronislava Nijinska e George Balanchine. Como que pedia desculpas por estar ali. Representou um apanhado de lugares-comuns da dança contemporânea em forma de exercícios.
Depois do fim das vanguardas e das utopias, reza a cartilha do tempo que é melhor realizar um espetáculo tradicional a arriscar-se por terreno desconhecido. No limite, não mais que bordar sobre cânones reconhecidos e estabelecidos.
Não que seja ruim que essa concepção tradicional de cultura alcance seu objetivo limitado. Mas seu verdadeiro sucesso depende de que as gerações que formar ponham abaixo o seu conservadorismo.
(À memória de Eleazar de Carvalho, em gratidão pelas segundas-feiras no Teatro Cultura Artística)

nobre.a2@uol.com.br


MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta coluna.


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