São Paulo, quarta-feira, 03 de janeiro de 2007

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MARCOS ANTONIO CINTRA

A integração financeira

APÓS 2003, os bancos, o mercado de capitais e de derivativos no Brasil aprofundaram seus vínculos com o sistema financeiro internacional. Os bancos nacionais e estrangeiros desenvolveram estratégias para expandir o crédito pessoal, mediante associação com financeiras e com redes de varejistas e o crédito corporativo. Até novembro de 2006, a concessão de empréstimos alcançou R$ 125 bilhões, o mesmo valor emitido pelo mercado de capitais.
Essa expansão da Bolsa de Valores de São Paulo esteve associada com a entrada dos investidores estrangeiros, os quais passaram a responder por 35% do volume negociado. Nas emissões de ações, os estrangeiros subscreveram mais de 60% da oferta. Simultaneamente ampliou-se o volume médio de negócios com American Depositary Receipts de empresas brasileiras na Bolsa de Valores de Nova York.
Até o início de novembro, o volume negociado em ADRs de empresas brasileiras em Nova York ultrapassou o total transacionado no mercado à vista da Bovespa. A dinâmica do mercado doméstico ficou condicionada às operações dos investidores estrangeiros na Bovespa e em Nova York.
Na Bolsa de Mercadorias & Futuros, o volume de negócios atingiu o recorde de US$ 8,8 trilhões (R$ 19,1 trilhões) até novembro. Ao mesmo tempo, o interesse do investidor internacional pelos altos juros praticados no Brasil fervilhou os negócios com contratos futuros de reais no exterior conhecidos como Non Deliverable Forward (NDF). Por meio desses contratos, os investidores estrangeiros podem comprar reais e vender dólares em uma data no futuro sem entrega física da moeda. A taxa de câmbio real/dólar passou a ser fortemente condicionada por essas operações e pelos contratos futuros de real negociados na Bolsa de Mercadorias de Chicago.
Finalmente, ampliou-se internacionalização de parte da riqueza das famílias e das empresas brasileiras. Segundo o BC, o estoque de capitais brasileiros no exterior atingiu US$ 111,7 bilhões em dezembro de 2005, um crescimento de 20% sobre o ano anterior.
Essa integração crescente dos mercados e dos agentes sofisticou o sistema financeiro doméstico e fomentou uma nova coalizão de interesses bastante distinta daquela que impulsionou o crescimento do setor industrial brasileiro (1930-1980). O atual modelo de desenvolvimento liderado pelas finanças e pelos setores exportadores de commodities contém muitas semelhanças com o padrão de crescimento característico da República Velha (1889-1930), exportador de café e integrado ao sistema financeiro internacional. Enfim, o êxito de alguns segmentos da sociedade não necessariamente garante os interesses da nação.


MARCOS ANTONIO CINTRA é editorialista da Folha.

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