|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TENDÊNCIAS/DEBATES
A "nova Câmara" será melhor que a anterior?
NÃO
Mais do mesmo na legislatura
MARCO ANTONIO VILLA
A ÚLTIMA legislatura da Câmara dos Deputados foi tão ruim
quanto as anteriores. Com
uma diferença: a crise política permitiu que fossem revelados escândalos
que já ocorriam -e há muito tempo.
A atual será sofrível: com sanguessugas, mensaleiros e cacarecos.
A distribuição do número de deputados por Estado distorce a representação popular e é fator gerador de crises políticas e descrédito da Câmara.
A sub-representação dos Estados do
Sudeste e do Sul e a sobre-representação do Norte, Nordeste e Centro-Oeste acaba enfraquecendo o Legislativo.
As várias Constituições republicanas só foram aumentando o problema: a de 1891 fixava um número mínimo de quatro deputados, mantido em
1934, ampliado para sete em 1946,
mantido pela Constituição de 1967. O
Pacote de Abril de 1977 diminuiu para
seis, mas, na atual Constituição, a representação mínima saltou para oito
deputados, o que se agrava ainda mais
pela criação de novos Estados.
Não é acidental que a maioria dos
membros do baixo clero provenha de
Estados sobre-representados, em que
o voto é controlado pelos oligarcas.
Manter tal distorção significa que os
destinos da Casa continuarão nas
mãos de deputados, por exemplo, de
Roraima ou Tocantins, eleitos por um
punhado de votos que mal daria para
eleger um vereador em uma cidade
média do Estado de São Paulo.
Em certa época, a opinião pública e
a imprensa imputaram as mazelas da
Câmara ao ano legislativo, considerado exíguo. Voltando às Constituições
republicanas, a de 1891 estabeleceu
um mínimo de quatro meses de trabalho. O mínimo foi a seis meses
(1934), nove (1946), caiu para oito
(1967) e voltou aos nove meses hoje.
Apesar de ter mais que dobrado o
período de trabalho em relação ao
Congresso da República Velha, isso
não teve nenhum significado na qualidade da ação política dos deputados.
Antes das eleições de 2006, pesquisadores estimavam que a renovação
da Câmara alcançaria 60%. A renovação foi inferior (46%), e a maioria do
baixo clero, além de deputados associados aos escândalos recentes, retornou à Casa. Continuaremos a assistir
ao triste espetáculo da negociação do
voto em troca de favores que incluem
a liberação de emendas parlamentares e a nomeação para as diretorias de
ministérios e estatais com o intuito de
"fazer caixa" para a próxima eleição.
Na última legislatura, não tivemos
sequer uma sessão ordinária ou reunião de comissão em que tenha ocorrido um grande debate político. O
quadriênio, em termos de debater o
Brasil, foi um tédio completo. O interesse eventual esteve restrito às reuniões das CPIs. Tanto que a cobertura
da mídia ficou restrita ao episódico,
assim como agora, quando, na falta de
grandes temas, os jornalistas já escolheram a musa da legislatura. E não é
a primeira vez, basta recordar a musa
da Constituinte, do impeachment etc.
Pode ser que o elevado número de
deputados (513) seja um fator que
aprofunde a crise do Parlamento. Temos uma das maiores Câmaras do
mundo. Nos EUA, que têm uma população quase 60% maior que a do
Brasil, o número de deputados na Câmara dos Representantes é de 435. A
Índia, cuja população é quatro vezes
maior que a nossa, tem uma Câmara
Baixa com 545 deputados. No caso
brasileiro, a ampliação do número de
cadeiras não teve nenhum significado
democrático. Pelo contrário, petrificou os interesses coronelísticos.
A sessão que elegeu o presidente da
Câmara foi um péssimo início de legislatura. Estava em jogo o terceiro
cargo em importância da República.
Porém, o plenário se comportou como se estivesse em um piquenique.
Raros foram os deputados que souberam explicar as razões ideológicas da
escolha de um dos candidatos.
Nos próximos quatro anos, as galerias da Câmara continuarão vazias, e
o plenário, deserto de deputados e de
idéias. A história do nosso Parlamento já foi bem diferente. Foi palco de
grandes debates e interesse popular.
Que bom seria se redivivos lá estivessem Teófilo Ottoni, Joaquim Nabuco,
Afonso Arinos, San Tiago Dantas, José Bonifácio, o Moço, e tantos outros.
MARCO ANTONIO VILLA, 50, é professor de história da
Universidade Federal de São Carlos (SP) e autor de, entre
outras obras, "Jango, um Perfil (1945-1964)".
Texto Anterior: Frases
Próximo Texto: Rogério Schmitt: A retomada da produtividade legislativa
Índice
|