São Paulo, sábado, 03 de fevereiro de 2007

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TENDÊNCIAS/DEBATES

A "nova Câmara" será melhor que a anterior?

SIM

A retomada da produtividade legislativa

ROGÉRIO SCHMITT

O DIAGNÓSTICO de que a última legislatura da Câmara dos Deputados teria sido uma das piores de toda a história do Congresso Nacional não é inteiramente despropositado. Ele está amparado em boas evidências empíricas.
Uma delas é o fato de que quase uma centena de parlamentares foi objeto de denúncias de corrupção nos escândalos do mensalão e dos sanguessugas. Desse total, três deputados foram cassados em plenário e seis renunciaram para evitar a inevitável cassação. Além disso, os índices de popularidade do Poder Legislativo -que, é verdade, nunca foram lá muito elevados- atingiram patamares muito reduzidos em 2005 e 2006.
Nesse sentido, é quase trivial a afirmação de que a legislatura recém-empossada terá de se esforçar muito para repetir o desempenho da anterior no que diz respeito ao evidente desgaste ante a opinião pública. Quando se chega ao fundo do poço, não há mais para onde ir, a não ser para cima.
Porém, também há boas evidências empíricas de que o retrospecto da última Câmara não foi tão ruim quanto se supõe à primeira vista. Pelo menos quando se adota como critério o veredicto do eleitorado. Nas eleições de 2006, não ocorreu nenhum aumento expressivo nas taxas de votos brancos e nulos. Do mesmo modo, os índices de reeleição parlamentar permaneceram muito próximos de sua média histórica. Os grandes partidos continuaram sendo grandes, e os pequenos continuaram sendo pequenos.
Vale lembrar, a propósito, que os deputados e senadores aprovaram na última legislatura uma série de reformas modernizadoras da legislação.
Foi o caso, por exemplo, da reforma do Judiciário, da previdência do setor público, da lei de falências e da abertura do mercado de resseguros.
Mas o fato é que quase todas as inovações institucionais que entraram em vigor no último quadriênio foram votadas pelo Congresso nos dois primeiros anos da antiga legislatura, antes do início da crise política.
Entre a eclosão do escândalo do mensalão (maio de 2005) e as eleições (outubro de 2006), quase nenhuma matéria relevante foi aprovada na Câmara.
No curto prazo, portanto, há excelentes razões para acreditar que os primeiros anos da nova legislatura deverão ser bem melhores que os dois últimos anos da legislatura anterior.
A agenda do Congresso dificilmente continuará dominada por escândalos e por CPIs. O foco das atenções certamente estará voltado para questões substantivas, como deve ser o caso, por exemplo, da tramitação dos projetos que integram o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
O início dos trabalhos da nova legislatura já sinalizou que os partidos políticos recuperaram poder de agenda sobre os parlamentares individuais. A escolha dos novos presidentes da Câmara e do Senado nitidamente obedeceu a critérios partidários e à clivagem governo versus oposição.
Na ponta do lápis, a base governista neste início de legislatura é formada por 11 partidos que agregam algo em torno de 350 deputados (quase 70% da Câmara) e de 50 senadores (cerca de 60% do Senado). Não foi nenhuma surpresa, portanto, que o peemedebista Renan Calheiros tenha sido reeleito com os votos de 51 senadores.
Na Câmara, a existência de dois candidatos da base aliada fragmentou os votos dos deputados governistas.
Mesmo assim, prevaleceu uma lógica partidária. A votação somada do petista Arlindo Chinaglia e do comunista Aldo Rebelo no primeiro turno foi de 411 deputados. Quando se exclui desse total a bancada do oposicionista PFL (que apoiava Aldo), restam 348 votos, o tamanho da base governista.
Mas o teste definitivo para avaliar o desempenho da nova Câmara será a capacidade de os deputados conseguirem dar continuidade à tramitação de uma série de projetos economicamente relevantes que há tempo estão infrutiferamente tramitando na Casa. A lista inclui proposições como o cadastro positivo no mercado de crédito, a lei das agências reguladoras, a reestruturação do sistema de defesa da concorrência e o novo marco regulatório do gás natural.


ROGÉRIO SCHMITT, 38, doutor em ciência política pelo Iuperj, é analista político sênior da Tendências Consultoria Integrada.

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