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CLÓVIS ROSSI
A rua começa a rugir
PARIS - Há umas duas semanas,
parei uns minutos em uma mesa-redonda na Deutsche Welle (programação em inglês) sobre a crise.
Um acadêmico, cujo nome não
anotei, dizia que a crise era até então apenas virtual -ou seja, estava
no noticiário dos jornais e nas estatísticas oficiais, mas não na rua.
Era também minha sensação, depois de ver o movimento de Natal e
pós-Natal no "meu" shopping em
São Paulo, as filas à porta da Louis
Vuitton da Champs Elysées em Paris e a agitação em muitas capitais
europeias pelas liquidações tradicionais do início do ano.
Acabou essa era. A crise começa
agora a ganhar a rua. É verdade que
já havia agitação em países como
Hungria, Bulgária, Grécia, Letônia,
Lituânia, Islândia (neste, a crise
produziu um resultado positivo: pela primeira vez, uma mulher foi indicada para comandar o governo
-e é assumidamente lésbica).
Mas esses países são da periferia
do sistema, inclusive -ou principalmente- do ponto de vista da cobertura jornalística. Agora, no entanto, a França já teve sua greve
(mais obedecida no serviço público), e o Reino Unido produz uma
das piores notícias da crise: cenas
explícitas de xenofobia por parte
dos trabalhadores, que já fizeram
uma greve, no setor energético, e
ameaçam uma série delas para que
os demitidos sejam trabalhadores
estrangeiros, não os britânicos.
Houve manifestações até na Rússia, cujo governo mantém boa parte
dos cacoetes soviéticos; a China reconhece que 20 milhões de trabalhadores migrantes perderam o
emprego nas cidades (15,3% do total) e estão sendo obrigados a voltar
para o campo.
A tendência só pode ser para pior
se estiver certo o cálculo da Organização Internacional do Trabalho de
que 51 milhões de postos de trabalho serão cortados só neste ano no
mundo todo.
Resta ver quantos governos mais
cairão além do islandês.
crossi@uol.com.br
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