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JOSÉ SARNEY
Napoleão, o café!
Em Genebra, o Brasil é tema do
Salão do Livro, o maior evento
cultural da Suíça. Estão presentes escritores não só brasileiros mas também franceses, que, de um modo ou
de outro, se inspiraram no Brasil para
escrever alguns livros importantes.
Entre eles, Jean Christophe Rufin, que
publicou agora um grande sucesso, o
mais vendido e comentado no mundo
da francofonia, "Rouge Brésil", Prêmio Goncourt, o "Nobel" da literatura
na França. Ao contrário do que sugere
o título -Brasil vermelho-, nada
tem com a vantagem de Lula nas pesquisas, não é uma intenção alarmista e
inaceitável do Merrill Lynch ou do
Morgan Stanley, mas uma história sobre o sonho francês da França Antártica, Villegagnon e o que conta Jean de
Léry sobre a aventura. O "vermelho"
aí são os paus de tinta, a riqueza do
Brasil pobre, mais pobre do que os pobres índios que comiam uns aos outros e devoraram muitos franceses, o
que talvez tenha inspirado Nelson Pereira dos Santos a fazer o filme "Como
Era Gostoso o Meu Francês", que não
é uma declaração de amor, mas o gosto da carne branca e rara dos bretões e
normandos que chegaram ao Rio de
Janeiro no século 16 naquela expedição.
Falaram também de suas obras com
a temática do Brasil Jean Soublin, que
fez uma biografia extraordinária de
dom Pedro 2º, bem escrita e resultado
de cuidadosa pesquisa, e Gilles Lapouge, autor de "Equinociais", livro
de viagem ao Brasil em que ele descobre, com a sensibilidade de quem vê,
as cidades, as gentes, a natureza e,
mais ainda, o tesouro escondido da
alma do nosso povo. Outra obra sua é
"Missão de Fronteira", saga de soldados portugueses que levam uma pedra gigante de cantaria para plantar
no interior da mata amazônica, às
margens do rio Negro, marcando o
domínio de Portugal.
Na Suíça, conhece-se muito pouco
da literatura brasileira. A oportunidade deste evento abre uma porta de interesse e curiosidade.
Mas, a hora, na Europa, não é só de
livros. É muito mais de política, em
particular das eleições francesas. De
tal modo que, ao ser apresentado a
um conselheiro (membro do colegiado que governa a região), ele foi logo
me perguntando: "Como vai a extrema direita brasileira?". Disse-lhe:
"Não temos". "Quer dizer que só extrema esquerda?" "Também não temos. O esquema do Felipão é não valorizar extremas." "Quem é Felipão, o
presidente da República?" "Não, o
técnico da seleção de futebol." "Mas
não estou falando de futebol, estou falando de Le Pen." "Bem, repeti eu,
também não temos." "Não é possível.
Só a França?"
No hotel, pergunto o nome do garçom que me serviria o café, um filipino de olhos bem orientais. Perguntei-lhe qual era o seu nome. Ele respondeu: "Napoleão".
Eu, então, com voz pausada, disse a
Napoleão: "Napoleão, traga-me café e
leite". "Sim, senhor." Depois, chamei-o e matutei: "Enquanto os franceses
estão pensando em Le Pen, eu estou
dando ordens a Napoleão".
"Napoleão, traga-me manteiga e
ovos fritos!"
É a história. Napoleão serve ovos fritos hoje, Le Pen vai lavar a cozinha
amanhã. Política, como literatura,
tem muito de ficção.
José Sarney escreve às sextas-feiras nesta coluna.
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