São Paulo, quarta-feira, 03 de junho de 2009

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Editoriais

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O fim de um ciclo

ATÉ ENTRAR em concordata, ser dividida e adquirida pelo governo Obama, anteontem, a General Motors era um raro sobrevivente de uma época dourada do capitalismo e da sociedade americanas.
A operação de resgate, para alguns, marcaria o auge da retomada do papel do Estado na economia, após anos de pregação ultraliberal. Vem, decerto, ao socorro de uma prática empresarial que sucumbiu -justamente nas últimas três décadas de desregulamentação e atrofia do poder sindical- à hiperconcorrência.
A GM americana não foi à lona porque tenha escolhido, equivocadamente, fabricar modelos de automóveis grandes e beberrões. O consumidor americano continuou a comprar os carros da companhia, líder em vendas nos EUA. O problema fundamental foram os custos exorbitantes acumulados pelo modelo de negócios da montadora.
Com 92 mil empregados concentrados no Meio-Oeste americano, a empresa tem compromissos, só em pagamento de aposentadoria, com 500 mil pessoas. Esses custos, herdados de uma era em que os sindicatos eram muito poderosos, o uso de mão de obra, mais intensiva, e a concorrência, bem menor, se mostraram incompatíveis com a realidade das últimas décadas.
Montadoras estrangeiras, sobretudo asiáticas, passaram a instalar plantas em outras regiões dos EUA, como o Sul. Mais flexíveis -na tecnologia, no projeto das fábricas e nas relações trabalhistas-, impuseram um patamar de preços que o modelo tradicional não poderia acompanhar sem acumular dívidas.
Ao empenhar US$ 50 bilhões no salvamento de uma parte menor da GM, tida como "saudável", a gestão Obama não inovou. "Os fundos poderiam ser gastos de modo mais produtivo para ajudar o Meio-Oeste a reduzir sua dependência da indústria automobilística", escreveu Robert Reich, que foi secretário do Trabalho de Bill Clinton.
Reich, ele mesmo nostálgico dos tempos em que grandes empresas dividiam com o governo americano a provisão do bem-estar social, não nutre ilusões acerca de um retorno aos paradigmas do passado. De fato, nada indica que a hiperconcorrência, fator crucial para o fim de um ciclo empresarial centenário na GM, vá arrefecer. Pelo contrário.


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