São Paulo, sexta-feira, 03 de julho de 2009

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JOSÉ SARNEY

Pinotti, um vazio que fica

NERUDA, quando Silvestre Revueltas morreu, disse num verso forte que sua impressão era que um carvalho tinha tombado no meio do tempo. Essa é a sensação que temos quando perdemos um amigo que não era só uma ligação sentimental, mas um homem que carregava qualidades e virtudes que envolvem nessa perda a sociedade, o patrimônio humano do País.
O professor Pinotti era um desses homens que não somente cultivava o gosto da convivência mas tinha uma personalidade de muitas faces, todas de grande expressão. Em primeiro lugar, o médico que envolvia sua profissão com o destino das pessoas e compreendia o quanto a saúde representa para a felicidade de todos, sentindo mais os que têm acesso à assistência médica. Mesclava em sua clínica o atendimento de ricos com o dos que não tinham meios, não como exercício da caridade, mas como um dever profissional.
Tinha excepcional capacidade como clínico e cirurgião, uma das maiores da medicina brasileira de todos os tempos. Ouvi de um colega seu que vê-lo operar era como assistir a um virtuoso pianista, tal a habilidade de suas mãos. Fazia sua arte com arte.
Outra faceta era do educador, do professor, do conferencista, de homem atualizado com o seu tempo, renovando-se sem parar. Seu nome não era restrito ao Brasil, tinha fama internacional, com especialização e sendo professor na Europa. Reitor da Unicamp, fez obra gigantesca de renovação. Intelectual, escreveu 37 livros sobre todos os aspectos da ciência médica, sem faltar na sensibilidade de eternizar sentimentos, os livros de poesia.
Publicou mais de 1.300 artigos científicos e duas teses. Uma técnica cirúrgica ganhou seu nome. Outra face era a do homem público, que estava na política para expor ideias, de preferência os temas de saúde e de educação. Mas não era só o teórico, era o construtor. Foi o primeiro a implantar o SUS no Brasil -no Estado de São Paulo-, sendo um dos nossos mais importantes formuladores de política previdenciária.
Era um homem de extraordinária inteligência, um cidadão exemplar, um pai de família padrão e um expositor incomparável. Inúmeras famílias no Brasil tiveram uma mulher sua cliente. A ele devo uma parte da vida de minha filha, a que sempre acompanhou como um pai. Era santo de altar em minha casa. Mas fica como marco de sua obra o quanto amou o seu trabalho pela saúde da mulher, principal objetivo de sua vida, advogando a prevenção e criando o Hospital da Mulher. Quando morre um homem como o professor Pinotti, ficamos menores em nossa paisagem humana e de valores.

jose-sarney@uol.com.br

JOSÉ SARNEY escreve às sextas-feiras nesta coluna.



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