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A vez do Mercosul
Bloco deveria enfrentar problemas internos que frustram livre comércio e flexibilizar regra que dificulta acordo externo
ENQUANTO ficar congelada
a agenda da liberalização
global de tarifas, que acaba de sofrer novo revés
em Genebra, a política comercial
do Brasil estará voltada para a
consecução de acordos menos
ambiciosos. O tema está incluído
na pauta da visita oficial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva
à Argentina, que começa hoje.
A divergência que colocou em
lados opostos as chancelarias
dos dois países na Suíça, se não
for tratada explicitamente no
encontro com Cristina Kirchner,
permanecerá no subtexto. O fato
de o Itamaraty ter endossado
proposta de abertura industrial
rejeitada pela Argentina não foi o
responsável pelo mais recente
fiasco da Rodada Doha. Ainda assim, deixa no ar algumas dúvidas
acerca do grau de convergência
entre as duas nações nas negociações internacionais que virão.
O Mercosul, como se sabe, tem
status oficial de união aduaneira:
Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai deveriam comportar-se
como uma só nação nas negociações sobre tarifas comerciais
com outros países ou blocos; o
imposto de importação sobre cada bem deveria ser único na região. Na prática, como também
se sabe, as tensões entre parceiros e as exceções à regra têm sido
tantas e tão constantes que desfiguram aquele objetivo formal.
A Argentina reclama dos duradouros déficits comerciais que
mantém nas transações com o
Brasil. Também teme, como ficou claro em Genebra, pela perda de competitividade de seu
parque industrial num ambiente
global cada vez mais aberto. O
país vizinho se ressente, tudo somado, de uma carência crônica
de investimentos produtivos na
indústria lá instalada.
Esse é um problema que precisa ser enfrentado no Mercosul.
Há outras regiões do bloco que
merecem atenção especial de
uma política regional voltada para estimular investimentos produtivos. Ela depende, contudo,
de os países membros abrirem
mão de malabarismos na política
econômica -como os sustentados ao longo da gestão de Néstor
Kirchner, que não tardaram a
produzir estragos- em benefício
de procedimentos e regras que
inspirem confiança nos investidores empresariais.
A agenda do bloco deveria estar voltada, nos próximos anos, a
um programa de desenvolvimento interno. Trata-se de superar entraves que, na política, no
acervo institucional e na infra-estrutura, impedem que o Mercosul concretize seu objetivo básico, o de comportar-se como
área de livre comércio -em que
mercadorias, serviços e investimentos circulam com o mesmo
grau de segurança, e sem ônus
tarifário, de um país a outro.
Flexibilizar a regra da união
aduaneira, conferindo mais liberdade aos países para que negociem acordos comerciais fora
do Mercosul, também seria um
ajuste realista. Combinadas, as
duas ações reequilibrariam o
bloco. Propiciariam margem para que os países divergissem em
questões externas -as mais difíceis de equacionar no médio prazo em qualquer projeto de associação entre nações- enquanto
concentrariam esforços e recursos em temas internos para os
quais a convergência já tarda.
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