São Paulo, sexta, 3 de outubro de 1997.



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Só se Deus fosse brasileiro

ELIANE CANTANHÊDE

Brasília - "Dar educação para o filho do excluído, para que ele não se transforme num excluidinho."
É assim, num estilo carola e pretensamente didático, que o governo vem tentando assumir a tese da disseminação da bolsa-escola pelo país.
O problema é que o PT chegou primeiro. A idéia começou com o governador Cristovam Buarque em Brasília, encontrou seguidores em alguns municípios e evoluiu para um programa de renda mínima que é a obsessão do senador Eduardo Suplicy.
O projeto do Planalto é mais ou menos como o de Brasília, onde o Estado paga uma espécie de mensalidade para as famílias que mantenham seus filhos menores na escola. Não custa muito. Tem um efeito social enorme.
Já o projeto que Suplicy defende prevê uma complementação financeira para as famílias que não atinjam um patamar "x" de renda. Custa bem mais. Mas tem um efeito social maior.
Pelo projeto do governo, o programa é das prefeituras e a União só ajuda. Pelo das oposições, o programa é federal, tem financiamento previsto no Orçamento da União, e apenas executado pelos municípios.
E onde mora o perigo? No poder de fogo eleitoral de projetos assim. O pretexto para a falta de consenso é técnico: quem paga a conta? A discordância, naturalmente, é política: quem fica com os louros nas eleições de 98?
É por isso que o governo fez malabarismos para recusar a proposta mais abrangente de Suplicy e patrocinar um projeto próprio, assinado pelo deputado Nelson Marchezan (PSDB-RS) e já modificado. Aprovado na Câmara, tramita no Senado.
As lideranças governistas bloqueiam a idéia do PT, a oposição obstrui o projeto do governo. O resultado é que as crianças continuam nas ruas, sem escola, sem merenda, sem futuro.
Fernando Henrique Cardoso e Eduardo Suplicy têm audiência no Planalto, dia 9, mas pode-se apostar desde já que não vai sair muita coisa dali. FHC vai tentar convencer Suplicy; Suplicy vai tentar convencer FHC. Nem as críticas do papa às desigualdades sociais brasileiras devem mudar isso.





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