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O pop
CLÓVIS ROSSI
São Paulo - Com todo o respeito, tenho enormes dúvidas de que as visitas
do papa cumpram, de fato, um papel,
digamos, evangelizador.
Se cumprissem, a Igreja Católica não
estaria enfrentando, no Brasil, as dificuldades de todos conhecidas e admitidas até pela sua própria cúpula. Vão
do crescimento de outros braços do
cristianismo e de seitas que têm mais
de comércio do que de fé ao aumento
do que o cardeal Eugenio Salles chamou de "falsos católicos".
Afinal, o papa já esteve duas vezes
no Brasil, com o enorme sucesso de
público que se repetiu ontem, à chegada para a terceira visita. Milhões de
brasileiros participaram de atos públicos a que o pontífice compareceu em
cada uma de suas estadas anteriores.
O que ficou delas? Um aumento no
número de fiéis? Parece pouco provável. Um aprofundamento da fé, ao
menos da ortodoxia rígida de que
João Paulo 2º é férreo defensor? Mais
improvável ainda, a julgar pelos dados da pesquisa Datafolha publicada
em caderno especial deste jornal, na
semana passada.
Uma maior consciência em torno da
necessidade de abrandar, ao menos, a
dívida social, uma cobrança que a
igreja faz há mais de um século, desde
que Leão 13 lançou a encíclica "Rerum Novarum"? Também improvável.
Tanto que o próprio papa sentiu-se
compelido a tocar no assunto de novo,
no seu discurso de chegada.
É claro que seria acreditar em milagres, o que parece fora de moda pelo
menos, imaginar que a simples passagem de um papa por um país fosse suficiente para mudar-lhe a face. Nem
deve ser esse, suponho, o objetivo das
viagens papais.
De todo modo, seria razoável esperar ao menos que sua mensagem ficasse gravada com mais força, quando
dita ao vivo e em cores.
Não parece estar sendo assim. As visitas se transformam, na prática, em
um grande espetáculo pop, que termina, sem deixar consequências, quando
o avião papal levanta vôo de volta.
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