São Paulo, sexta-feira, 03 de outubro de 2008

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Cautelas fiscais

Crise exige mudança de atitude no governo Lula, que deveria deixar de lado a gastança e frear as despesas de custeio

EXPORTADORES e agricultores brasileiros, com dificuldade de obter crédito para tocar seus negócios, acusam os primeiros golpes advindos da crise financeira global. Pequenos e médios bancos também já passam por algum aperto para tomar recursos de outros bancos -tanto no exterior como no mercado brasileiro. Todos esses casos já demandam algum grau de intervenção das autoridades, a fim de evitar efeitos indesejáveis da escassez de crédito.
Delineia-se, por outro lado, um quadro de desaceleração da economia brasileira, em que a arrecadação tributária não poderá sustentar a alta vigorosa verificada nos últimos anos.
Por tudo isso, as autoridades federais deveriam adotar, já, algumas cautelas na política econômica.
No campo da política monetária, cabe avaliar com cuidado a intensidade do freio na atividade econômica imposto pela crise internacional, assim como o movimento das cotações das commodities e do câmbio. Aumentos adicionais da taxa de juros básica vão tornar-se menos recomendáveis, assim como poderá delinear-se, de maneira bem mais precoce, uma conjuntura em que passar a cortar a taxa Selic irá tornar-se obrigatório.
Problemas na circulação do dinheiro, na forma de crédito, na economia doméstica também vão exigir atuação rápida e incisiva do Banco Central. Medidas para estimular o fluxo de empréstimos principalmente entre os bancos, como a redução dos chamados depósitos compulsórios -a parcela dos recursos dos bancos retida no BC-, são cada vez mais prováveis.
Falta, contudo, uma alteração de rumo abrangente na política fiscal, que possa responder seja às novas exigências de apoio público, seja à perspectiva de piora na receita com os impostos.
No embalo de recordes sucessivos de arrecadação, os governos em geral - em particular o federal - têm sido pródigos no aumento de despesas de custeio, em especial na concessão de aumentos salariais. O pacote oferecido pelo presidente Lula a servidores federais em 2008, por exemplo, redundará numa despesa adicional e permanente de R$ 31 bilhões por ano.
Se tamanha lassidão fiscal já era condenável quando a economia do país atravessava um momento excepcionalmente favorável, mantê-la a partir de agora será um ato de irresponsabilidade atroz. A efetividade da política econômica para responder aos desafios gigantescos que esta crise pode erigir depende diretamente do peso das despesas de custeio no Orçamento.
Quanto mais comprometido e enrijecido estiver o caixa do governo, menor será a sua capacidade de evitar, por exemplo, uma queda acentuada na taxa de investimento produtivo do país, uma perda abrupta de receitas com exportações ou uma deterioração no sistema financeiro.
Está esgotada a margem para fanfarronices fiscais. O cenário mudou -e exige realismo.


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